quinta-feira, 1 de abril de 2010

PARECER FINAL

Caros alunos,
Queiram, por favor, postar aqui a sua opinião sobre o Curso da Disciplina "Teoria do Conhecimento Científico". Trata-se de avaliar o material didático, o método de aula e o desempenho do próprio aluno nas atividades da disciplina.

AVALIAÇÃO FINAL

Caros Alunos,
A AVALIAÇÃO FINAL Na Disciplina Teoria do Conhecimento Científico será constituída pela redação de um texto original que deverá ter duas páginas, no mínimo e quatro paginas no máximo, ou cerca de 500 até 1.000 palavras, versando sobre um tema discutido nas aulas ou nos textos examinados durante o curso da disciplina.
Os textos deverão ser postados como comentário a esta mensagem. E serão recebidos até as 24:00hs. do dia 04 de maio de 2010.

LEMBREM-SE que o resultado do desempenho dos alunos nesta disciplina envolve: a)participação nas aulas; b)envio de comentário a todos os textos postados neste site; c)elaboração da AVALIAÇÃO FINAL.

CAPÍTULO 12 - Progresso Científico e Eliminação de Contradições

PROGRESSO CIENTÍFICO E ELIMINAÇÃO DE CONTRADIÇÕES


Introdução


Neste texto, pretende-se explorar a tese de Popper apresentada em "Intellectual autobiography", onde ele afirma que a "tríade dialética" (tese- antítese-síntese) pode ser interpretada como uma forma de seu método de tentativa e eliminação do erro. (1) Em um propagado artigo escrito em 1937, publicado na revista Mind 49 (1940), posteriormente revisto e republicado em Conjectures and refutations, em 1963, com o título "What is dialetic?", Popper critica a dialética em dois de seus então correntes significados: a) como teoria da lógica; b) como interpretação geral do mundo.(2)

1.


A dialética como teoria da lógica - ou lógica dialética - preconiza o abandono da "lei da exclusão das contradições". Com isto se pretendia preservar o caráter fértil das contradições como recurso lógico de compreensão do real.

Recorrendo a regras de inferência, pode-se argumentar que se uma teoria contém uma contradição, ela implica tudo, por conseguinte, implica nada. Dessa forma, uma teoria que implica contradição é inútil como teoria. Popper afirma: “No momento, devo afirmar que nossa análise não conduz à conclusão de que a dialética tem qualquer semelhança com a lógica, pois a Lógica pode ser descrita - de maneira superficial, mas suficiente para o presente propósito - como uma teoria da dedução. Não temos razões para acreditar que a dialética tem algo a ver com dedução.(3)

A força dessa crítica a certas interpretações da dialética pode ser minimizada com a alegação de que ela não demonstra de forma irrecorrível a inutilidade de teorias contraditórias, pois estas podem ter interesse em si mesmas e, ainda, podem ser corrigidas de modo a tornarem-se consistentes (impedindo que se cheguem às falsas conclusões implicadas logicamente na teoria).

Contudo, a crítica continua a valer, pois, se adotarmos uma teoria da dedução que admita a contradição, isso nos impedirá de procurar uma outra teoria que seja melhor do que ela. Se aceitarmos as contradições, já não haverá razões para a crítica - será o colapso da ciência e o fim do progresso intelectual. Criticar consiste, em grande parte, na tentativa de descobrir as contradições que uma teoria apresenta. O progresso resulta da superação dessas contradições. (4)

2.


A dialética como interpretação geral do mundo é apresentada por Popper como decorrente da postura idealista de Hegel, do materialismo dialético e do historicismo de Engels e Marx. (5) Ele argumenta que o idealismo hegeliano é:

1. uma forma de racionalismo reforçadamente dogmático, pois constitui um sistema assegurado contra qualquer tipo de dúvida, na medida em que esse sistema está pronto para conviver com contradições;

2. ambíguo em suas expressões, pois descrever o desenvolvimento da razão em termos dialéticos - que, aliás, podem ser reconhecidos como especialmente apropriados na interpretação da história da filosofia - implica na idéia de que a dialética é uma teoria do raciocínio. Contudo, quando se aplica a interpretação dialética do pensamento ao raciocínio científico isso só gera ambigüidades. Os episódios da história da ciência podem ser interpretados à luz da teoria dialética, contudo, a dialética não é apropriada para a interpretação da lógica do raciocínio científico;

3. totalmente absurdo, pois Hegel, em sua teoria da identidade, identifica a razão com a realidade. Assim, com base na tese que a razão se desenvolve dialeticamente, conclui-se que o mundo deve obedecer às leis da dialética. Popper argumenta que o "panlogismo" hegeliano desconsidera o fato de que a inexistência de fatos contraditórios não decorre de leis da física, mas é tão somente uma exigência lógica, isto é, decorre das normas que regulamentam o uso da linguagem científica.

A dialética, na interpretação de Marx, torna-se materialismo histórico. Nesse sentido, é passível de ser considerada como racionalismo reforçadamente dogmático e como ambígua em suas expressões. E, sem tirar muita vantagem disso, ela abandona a teoria da identidade de Hegel. Em Marx e Engels, a dialética torna-se teoria do desenvolvimento social. Nesse sentido, as contradições seriam as forças dinâmicas do desenvolvimento histórico. Entretanto, a dialética não pode ser tida como base segura para previsões científicas. Isso decorre, principalmente, de seu caráter irrefutável. Ela é suficientemente vaga e elástica para ajustar suas previsões a qualquer situação.(6)

Marx acreditava no desenvolvimento do conhecimento e da sociedade. Porém, os marxistas adotaram uma atitude dogmática e conservadora em relação ao sistema de Marx. Isso ocorreu na medida em que eles tomaram a interpretação marxista da dialética como a última palavra.

Como forma de reação a isso, Popper sugere que se abandone a interpretação marxista da dialética e que se procure entendê-la como forma do método de tentativa e eliminação do erro. Ele insiste na sugestão de que seria preciso dissociar Marx e suas idéias progressistas, evolucionárias, e até revolucionárias, da influência conservadora e totalitária de Hegel. O ‘marxismo científico’ teria feito das idéias de Marx um sistema dogmático "...impedindo o desenvolvimento científico que poderia ter experimentado".(7)


3.


O ponto central do argumento contra a dialética como teoria da lógica é que ela implica em contradição. A dialética, como teoria da lógica, é contraditória, pois, embora construída para preservar o caráter frutífero das contradições, resulta numa teoria estéril do argumento dedutivo. Essa lógica dialética pressupõe que as contradições são extremamente férteis para se compreender o real e produzir o progresso. Disso resulta, contraditoriamente, uma teoria da inferência lógica, na qual as contradições tornam as teorias inúteis, e a aceitação da negação torna a descoberta do novo um instru- mento de manutenção do ‘status quo’.

A resposta dialética a essa objeção só pode ser no sentido de aceitar a tese de que a dialética é de fato contraditória. E, nesse sentido, seria a síntese da fertilidade e da esterilidade de que é acusada. Seria progressista e conservadora ao mesmo tempo, mantendo o mesmo caráter contraditório de tudo o que é real. Dessa forma, seria neutralizada a crítica. Assim, Popper aponta o caráter contraditório da dialética como teoria da lógica. Ela seria uma teoria da argumentação estéril-fértil. E nada se seguiria da crítica popperiana. Disto resultaria, portanto, que o argumento de Popper teria novamente razão ao expor o caráter reacionário dessa teoria do argumento. Nesse sentido, a lógica dialética não seria inconsistente, teria tratado a crítica de tal forma que, embora ela estivesse correta, disso nada haveria de se seguir. Nenhum ganho teria havido, nem dessa contradição apontada pelo argumento, nem de nenhum outro argumento possível. E isso certamente sugeriria o fim da atividade intelectual. Popper diz: “Assim, precisamos dizer ao dialético que ele não pode manter essas duas posições ao mesmo tempo. Ou ele está interessado nas contradições por causa de sua fertilidade: então, necessita recusá-las; ou ele está preparado para aceitá-las: então, elas serão estéreis e a crítica racional, a discussão, e o progresso intelectual serão impossíveis. A única "força" que provoca o desenvolvimento dialético é a nossa determinação em não aceitar, ou rendermo-nos às contradições entre a tese e a antítese. Não existe uma força misteriosa dentro dessas duas idéias, nem uma tensão misteriosa entre elas, que promova o desenvolvimento - é simplesmente nossa decisão, nossa resolução de não admitir contradições, o que nos induz a procurar por um ponto de vista novo, que nos permitiria evitá-las. Essa resolução é inteiramente justificada, porque pode ser facilmente mostrado que, se alguém aceitasse as contradições, então, teria de abandonar toda atividade científica: isso significaria o completo fracasso da ciência.” (8)

O ponto central do argumento contra a dialética como teoria geral do mundo é que ela corresponde a uma linguagem vaga e metafórica.
A teoria de que as contradições são necessárias em razão da sua fertilidade, é uma forma metafórica e ambígua de se referir a nossa decisão de superar as situações contraditórias. Essa linguagem metafórica é perigosa, porque pode implicar a idéia de que não necessitamos evitar as contradições, o que significaria o fracasso da crítica e da racionalidade. (9)

A dialética, como teoria geral do mundo, tem sido expressa por meio de uma linguagem metafórica e confusa, na qual, em vez de "tese-antítese- síntese", fala-se em "negação", no lugar de "antítese", e "negação da negação", no lugar de "síntese". Usa-se o termo "contradição" quando o que de fato se quer dizer é "conflito" ou "oposição de tendências".

A linguagem vaga na qual têm resultado as análises dialéticas tem permitido que se mantenha a idéia de que ela é uma teoria geral do mundo capaz de interpretar todos os processos de desenvolvimento. Descrever, por exemplo, o processo pelo qual uma semente produz uma planta, que produz outras sementes, em termos de tese-antítese-síntese, é usar uma interpretação tão vaga de dialética que resulta em afirmar quase nada. (10)

4.


A resposta mais extensa e sistemática às críticas de Popper a certas interpretações da dialética foi publicada por Maurice Cornforth em 1968. (11)

Cornforth alega que, diferentemente 'daquilo que é suposto no argumento de Popper, o enfoque materialista dialético, recomendado por Marx e Engels, deveria ser interpretado em oposição ao "erro idealista da falsa abstração", ou o "tipo de erro implicado na palavra metafísica.” (12) Assim, o sentido da dialética engeliana e marxista pode ser captado em sua oposição à "metafísica". A dialética consistiria em alternativa diante da constatação do fracasso da metafísica em conectar e inter-relacionar as coisas. A metafísica, ao considerar as coisas individualmente, teria perdido o sentido das interconexões que constituem o real. (13) Cornforth diz: “A interpretação que Engels faz da dialética torna claro que, para o marxismo, o enfoque dialético significa considerar as coisas em suas reais interconexões, em vez de separadas e, portanto, em suas mudanças (vindo a ser e se extinguindo) em vez de abstrair da mudança.” (14)

No que tange às críticas de Popper à dialética em Hegel, Cornforth assume-as na extensão suficiente para se desfazer do idealismo hegeliano. Contudo, pretende resgatar o significado da dialética implicado em Hegel
.
Na interpretação de Cornforth, a tradição filosófica teria produzido um enfoque materialista metafísico. Hegel teria contribuído com uma visão idealista dialética. Porém, apenas em Marx é que se teria produzido um modelo materialista dialético de filosofia. Cornforth afirma: “Hegel (e, em grau menor, Platão) oferece uma lição de como um bom enfoque dialético, oposto ao enfoque não-dialético ou metafísico, pode transformar-se em bobagem ao ser combinado com o idealismo. O pensamento materialista, anterior a Marx, da mesma forma, fornece uma lição de como um bom enfoque materialista, oposto ao idealismo, pode se tornar uma bobagem ao ser combinado com a metafísica ou ao se tornar não-dialético".(15)

O que a interpretação de Cornforth sobre a obra de Hegel parece sugerir é que o materialismo dialético de Engels e Marx expressam o que há de melhor nessa obra.
Segundo Cornforth, o argumento de Popper de que o materialismo dialético expressa um dogmatismo reforçado não procede. Embora constituído por princípios metodológicos gerais, o materialismo dialético não implica previsões, sendo, portanto, irrefutável. Porém, as previsões baseadas no materialismo dialético seriam falseáveis. Do que se segue que a acusação de "dogmatismo reforçado" só seria pertinente se dirigida à atitude de certos marxistas. (16)

O problema com a resposta de Cornforth às críticas de Popper a certa interpretação da dialética é que ele não responde de fato às críticas feitas. Apenas contesta de forma direta a alegação de Popper de que a interpretação identificada como alvo da crítica é a interpretação de Marx e Engels.

A interpretação que Cornforth apresenta do significado da dialética em Engels e Marx é, em grande parte, uma reação às críticas de Popper. O que isso significa é que Conrforth teria produzido uma interpretação do significado da dialética em Marx e Engels de forma a escapar dos pontos críticos apontados por Popper. O que Cornforth faz é produzir uma interpretação de Engels e Marx, para os quais as críticas de Popper perderiam a sua força. Em última instância, ele parece contrapor sua interpretação de Engels e Marx à interpretação de Popper. O que ele parece produzir, contudo, é muito próximo de uma interpretação popperiana de Marx e Engels.

Tomemos apenas dois exemplos de como isso acontece. Primeiramente, Popper critica a interpretação de que a dialética seria uma teoria da dedução, da qual se excluiria o princípio de identidade. Em resposta, Cornforth interpreta a dialética de forma que ela não implique a exclusão do princípio de identidade. (17)

Em segundo lugar, Popper critica Hegel, Marx e Engels por causa de sua teoria geral do mundo. Cornforth alega que, assim como o rei Midas, que transformava tudo o que tocava em ouro, Popper reduz tudo o que discute a absurdos. Assim, o materialismo dialético lhe parece uma bobagem, porque a reconstrução que ele faz é absurda. (18)

De uma forma geral, a resposta de Cornforth às críticas de Popper poderiam ser resumidas na constatação de que aquele pretende indicar o sentido da verdadeira crítica. Verdadeira seria a crítica construtiva. E esta consistiria em aplicar as regras do método materialista dialético. As críticas de Popper não são fundamentadas num enfoque materialista dialético, do que se segue que elas operam com falsas abstrações. Segundo Cornforth, o materialismo dialético constitui 'uma base legítima', porque as teorias que não o empregam permanecem abstratas e parciais". (19)

Assim, criticar o Marxismo conforme os princípios do materialismo dialético, consistiria em apontar os desvios na aplicação desses mesmos princípios. Criticar os marxistas consistiria em demonstrar que eles não foram suficientemente longe na aplicação daquilo que Marx, Engels e Lenin estabeleceram como método da investigação.(20)


5.



Popper argumenta que a dialética - ou a teoria da tríade dialética pode ser descrita nos termos de uma teoria que sustenta que certos desenvolvimentos ou processos históricos se desenrolaram de forma típica. Contudo, nesses casos, assim como em outros, seria mais elucidativo considerá-la como parte da teoria da tentativa e eliminação do erro. Popper afirma: “A dialética ou, mais precisamente, a teoria da tríade dialética, sustenta que certos desenvolvimentos, ou certos processos históricos, ocorrem numa certa forma. Assim, ela é uma teoria empírico-descritiva, comparável, por exemplo, com a teoria que afirma que muitos dos organismos vivos aumentam seu tamanho durante certo estágio de seu desenvolvimento, que então permanece constante para, finalmente, diminuir até que eles morram, ou com a teoria que sustenta que as opiniões são mantidas dogmaticamente, num primeiro momento; em seguida, ceticamente, e, somente depois, num terceiro estágio, com um espírito científico, isto é, criticamente. Assim como essas teorias, a dialética não é aplicável sem exceções - a menos que forcemos as interpretações dialéticas - e, do mesmo modo que essas teorias, a dialética não tem uma especial afinidade com a lógica.” (21)

O argumento parece sugerir que, dar à dialética uma interpretação evolucionária, baseada na teoria da tentativa e eliminação do erro, poderia resgatá-la de suas atuais dificuldades e dar-lhe uma forma mais adequada às exigências de construção de teorias racionais.

A interpretação evolucionária do conhecimento humano faz parte do contexto mais amplo da teoria geral da evolução da vida. Popper argumenta que existem três níveis em que se processa a adaptação do ser humano e, nesses três níveis, o processo de adaptação é sempre o mesmo: (22)

1. A adaptação genética, que corresponde à mutação de um gene; isso altera a relação com o meio ambiente, do que se segue a possibilidade de novas adaptações genéticas.

2. A adaptação comportamental, que corresponde à mutação do comportamento; isso significa a mudança do próprio meio ambiente, do que se seguirão pressões no sentido de que novas alterações genéticas se processem.

3. A adaptação cognitiva, que corresponde à mutação das teorias ou idéias. Essa adaptação acontece, principalmente, por meio da produção do conhecimento científico.

Baseando-se em problemas, ou em situações-problema, o ser humano propõe certas conjecturas ou hipóteses, que talvez resolvam esse primeiro problema. Mas novos problemas surgirão, ainda mais profundos e comprometedores, cuja solução conjectural proporá outros ainda mais numerosos. Assim evolui o conhecimento racional, do qual a ciência é um caso particular.

Todo processo de adaptação surge da existência de uma "estrutura herdada", que se corresponde nos três níveis. Assim, há a "estrutura genética do organismo", que é o fundamento da adaptação genética; há o "conjunto inato de padrões de comportamento", que é o fundamento da adaptação comportamental; e, finalmente, há as "teorias e conjecturas científicas vigentes", que constituem o fundamento da adaptação cognitiva. Essas estruturas herdadas são sempre transmitidas pela instrução. Assim, o ser humano é instruído genética, comportamental e cognitivamente.

Essas "estruturas herdadas" sofrem certas pressões, que exigem mutações ou adaptações ou evolução. As instruções herdadas, quer geneticamente quer por meio da tradição, estão sujeitas a pressões, desafios e problemas e, conseqüentemente, sofrem variações. Porém, há ainda um problema a ser resolvido, pois a "estrutura herdada" sofre pressões que surgem no interior da própria estrutura, podendo ocorrer, assim, modificações ou variações nas "instruções herdadas". Cabe, ainda, indagar sobre a forma pela qual se processa a "seleção" entre mutações ou variações possíveis.

A seleção se processa pelo método do ensaio e da eliminação do erro. As tentativas não adaptadas perecem, enquanto as mais adaptadas e de maior sucesso se transmitem. Dessa forma, embora o processo caminhe para mutações solucionadoras de problemas, jamais atingimos uma solução final. Há sempre a possibilidade de uma nova mutação mais apropriada para atender as pressões exercidas sobre a estrutura. Na análise de Popper: “Cumpre notar que, via de regra, não se atinge o estado de equilíbrio adaptativo em qualquer aplicação do método da tentativa e eliminação do erro, isto é, pela seleção natural. Em primeiro lugar, porque soluções perfeitas, ou ótimas, para o problema, dificilmente se apresentam. Em segundo lugar - e este é o ponto importante -, porque a emergência de novas estruturas, ou de novas instruções, provoca uma alteração da situação ambiental. Elementos novos dos ambientes podem tomar-se relevantes: em conseqüência, novas pressões, novos desafios e novos problemas podem manifestar-se, como resultado de mudanças estruturais que surgiram de dentro do organismo.” (23)

A teoria da ciência inspirada nessa perspectiva evolucionista estabelece as bases para uma teoria evolutiva do progresso científico. Há, portanto, um esquema válido, que representa uma descrição racional da emersão do ser humano no processo evolucionário, da autotranscendência por meio da seleção e da crítica racional. (24)

Esse esquema toma evidente a analogia que existe entre a evolução biológica, até o surgimento do ser humano, e o processo do conhecimento científico.

Esse processo é de natureza evolutiva. Aplica-se tanto à evolução biológica dos seres vivos como ao progresso do conhecimento científicos. (25)


Conclusão


Apesar da confissão de Popper de haver proposto seu esquema evolucionário, ao tentar interpretar o processo trifásico da dialética tese-antítese-síntese, como considerando-a uma forma do método de tentativa e erro, podemos notar que a similaridade entre os dois processos é apenas superficial. (26) No processo dialético hegeliano, as contradições são partes integrantes do processo, não devendo, portanto, ser eliminadas; elas representam elementos impulsionadores do processo, não havendo lugar para a atitude crítica. (27)

Por outro lado, no esquema evolucionário, a eliminação do erro processa-se por meio das críticas que procuram identificar as contradições e eliminá-las. A eliminação das contradições significa o crescimento do conhecimento na busca da verdade. Portanto, o esquema evolucionário de Popper não pode ser entendido como análogo ao processo dialético hegeliano.

Conforme podemos depreender do esquema evolucionário, o conhecimento científico começa com problemas e termina com problemas. Inicia-se pelo problema, com todas as suas implicações. De um ponto de vista lógico, a primeira etapa do processo de conhecimento é a identificação da situação-problema.

O que se pretende, com este texto, é retomar os argumentos popperianos críticos da dialética. Parece que, até hoje, não foram oferecidas boas respostas às críticas que esses argumentos contem.

Não é relevante para essa crítica a conclusão de que ela não corresponde a uma interpretação fiel da dialética de Hegel, Engels ou Marx. Mais importante do que isso é o sentido que as críticas de apresentam. Elas parecem indicar uma interpretação do sentido do processo da natureza e do progresso do conhecimento. Nesse sentido, a dialética aparece como um caso especial da teoria da tentativa e eliminação do erro.

O que isso sugere é que, em seu sentido renovado, isto é, como forma do método de tentativa e eliminação do erro, a dialética poderia ser revivida como instrumento eficiente na análise de determinadas situações. O sentido renovado da dialética nos permite refletir sobre o significado das controvérsias no progresso do conhecimento racional, com especial referência ao papel da eliminação das contradições na construção do conhecimento científico.


Notas e referências


1.POPPER, KARL R. "Intellectual autobiography" in SCHILPP, PAUL ARTHUR (ed.) The philosophy of Karl Popper. Col. "The Library of Living Philosophers", vol. XIV, livro 1. La Salle, Illinois, Open Court, 1974, p. 105.

2. Idem. Conjectures and refutations. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1972, pp. 312-335.

3. Idem, ibidem, p. 322.

4. Idem, ibidem, p. 316.

5. Idem, ibidem, p. 329.

6. Idem, ibidem, p. 333.

7. Idem, ibidem, p. 335.

8. Idem, ibidem, p. 317.

9. Idem, ibidem, p. 322.

10. Idem, ibidem, p. 323.

11. CORNFORTH, MAURICE. The open philosophy and the open society: A reply to Dr. Karl Popper's refutations of marxism. Nova York, International Publishers, 1976, pp. 60-126.

12. Idem, ibidem, p. 60.

13. Idem, ibidem, pp. 60-61.

14. Idem, ibidem, p. 67.

15. Idem, ibidem, p. 69.

16. Idem, ibidem, p. 94.

17. Idem, ibidem, pp. 76-77.

18. Idem, ibidem, p. 123.

19. Idem, ibidem, p. 89.

20. Idem, ibidem, pp. 100-101.

21. POPPER, KARL R. Conjectures and refutations. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1972, p. 322.

22. Idem. 'A racionalidade das revoluções científicas, in HARRÉ, ROM (org.) Problemas da revolução científica. São Paulo, Itatiaia/Edusp, 1976, pp. 92 ss.

23. Idem, ibidem, p. 94.

24. Idem. Objective knowledge. Oxford, Clarendon Press, 1981, p. 288.

25. Idem. "Autobiography", in SCHILPP, PAUL ARTHUR (org.) The philosophy of Karl Popper. Col. "The Library of Living Philosophers", vol. XIV, livro 1. La Salle, Ilinois, Open Court, P. 105.

26. Idem. Objective knowledge. Oxford, Clarendon Press, 1981, pp. 126-127.

27. Idem. Conjectures and refutations. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1972, p. 326.

´CAPÍTULO 11 - Racionalismo Crítico e Ciências Sociais

RACIONALISMO CRÍTICO E CIÊNCIAS SOCIAIS




“A coisa mais importante sobre o conhecimento humano é que ele pode ser formulado em linguagem, em proposições. Isso torna o conhecimento passível de ser consciente e de ser objetivamente criticável por meio de argumentos e de testes. Nesse sentido nós chegamos à ciência. Testes são tentativas de refutação. Todo conhecimento permanece falível, conjetural. Não existe justificação; evidentemente, não existe também justificação final de uma refutação. Contudo, nós aprendemos por meio de refutações, ou seja, pela eliminação de erros, por reexame.” (Popper, Karl R.; Realism and the aim of science. London, Hutchinson, 1985, p. XXXV).


INTRODUÇÃO


Neste texto pretende-se argumentar que o paradigma(1) racionalista crítico de análise social, expresso principalmente nas idéias de Karl R. Popper, pode ser interpretado como associado a uma mudança de caráter mais geral que teria ocorrido na teoria da ciência, na passagem do século XIX para o século XX. As epistemologias do século XIX, que são aqui consideradas em certas interpretações do positivismo e do marxismo, implicam um conceito de razão como um instrumento de conhecimento verdadeiro. Numa certa interpretação, positivismo e marxismo identificam todas as formas de conhecimento racional com ciência e com conhecimento verdadeiro, isto é, justificado empiricamente. Portanto, implicam numa epistemologia justificacionista, para a qual a existem condições de possibilidade da demonstração da verdade de nossas asserções sobre o mundo.

Aqui se sugere que o conceito de conhecimento racional, conforme a interpretação do racionalismo crítico de Popper, pode ser considerado como diverso daquele consagrado pelas epistemologias justificacionistas do século XIX. Em contraposição ao marxismo e ao positivismo, o racionalismo crítico retoma a idéia socrática que a razão humana é um instrumento de crítica e debate, cujo resultado só pode ser um conhecimento hipotético e conjectural. A teoria do método científico de Popper implica uma forma alternativa de considerar os fenômenos sociais. Uma das conseqüências de sua teoria do método de análise social é que o conhecimento dogmático deve ser substituído pela teoria social conjectural.

O argumento aqui apresentado está dividido em duas partes. Na primeira se analisa a base epistemológica das teorias sociais do século XIX. Na segunda parte se considera o modelo de racionalidade que Popper sugere ser característico da epistemologia das Ciências Sociais do século XX.( 2)



1

Nesta parte se pretende caracterizar a passagem do século XIX para o século XX nos termos de uma transformação filosófica. O ponto central do argumento consiste na alegação de que essa transformação tem um caráter primordialmente epistemológico.

A passagem do século XIX para o século XX pode ser caracterizada em termos de uma profunda mudança no mundo das teorias que procuram dar conta das condições de possibilidade do conhecimento humano, com especial referência ao conhecimento científico. Aqui se sugere que essa mudança teria produzido dois tipos de conseqüências, isto é, conseqüências tecnológicas e culturais. A revolução tecnológica está presente na enorme quantidade de recursos para o controle de vários aspectos da realidade e que estão hoje disponíveis. Assim, os novos recursos em medicina, em engenharia, em comunicações são uns poucos exemplos dos recursos técnicos dos quais o ser humano pode dispor.

Por outro lado existe uma diversidade cultural entre esses dois séculos, a qual pode ser expressa na idéia de que a cultura do século XX se caracteriza por ser uma cultura de transição.(3) Parece que, durante os processos de mudanças generalizadas, como os que ocorrem nas culturas de transição, homens e mulheres estão especialmente preocupados com o problema da identidade cultural. Existe uma certa circularidade entre a cultura e o processo de produção cultural. Assim, é daquilo que se identifica como sua cultura que se constroem os problemas e é a cultura que inspira o tipo de solução que homens e mulheres propõem para seus problemas.

As sociedades industriais modernas parecem culturalmente identificadas com o processo de mudança. Esse processo de mudança generalizada tem profundas influências no tipo de solução que os seres humanos dessas sociedades industriais propõem para os problemas. Assim, existe uma íntima conexão entre o desenvolvimento das sociedades industriais modernas e a produção e a divulgação de uma cultura crítica e não-dogmática. Neste argumento se pressupõe que isso constitui uma importante característica da cultura do século XX. Do fato do século XX ser culturalmente identificado como um período de profundas mudanças, segue-se que essas sociedades industriais modernas estão de alguma forma associadas ao desenvolvimento de uma cultura de crítica e de debate. O que aqui se argumenta não implica que as sociedades industriais modernas sejam necessariamente críticas e caracterizadas pela contestação das teorias dogmaticamente defendidas no século XIX. Nem se defende a idéia de que não existe cultura crítica fora das sociedades industriais modernas.

Esse tipo de processo cultural caracterizado pela idéia de mudança não é único na história humana. Talvez o fim do período clássico possa ser considerado com uma interpretação similar. O fim dos tempos medievais e início dos tempos modernos poderiam ser considerados como outros exemplos de momentos históricos passíveis dessa interpretação. Tudo parece indicar que, no caso em questão, o processo de mudança teria sido seguido pelo desenvolvimento e pela divulgação de um determinado tipo de epistemologia, para a qual o conhecimento racional é hipotético e conjetural. Assim, no caso específico da passagem do século XIX para o século XX, teria se produzido uma mudança especial de natureza epistemológica, qual seja a articulação das teses do racionalismo crítico, isto é, a teoria de que o conhecimento racional é crítico, discutível, conjectural.


2.


A mudança cultural dos últimos dois séculos produziu várias conseqüências. Nesta parte, contudo, pretendem-se destacar algumas implicações filosóficas dessa mudança. Especificamente, pretende-se apontar seu caráter epistemológico. Isto é, o século XIX se caracteriza por uma postura filosófica que implica uma certa fundamentação epistemológica para o conhecimento racional.

Certas interpretações do positivismo e do marxismo são as epistemologias mais características do século XIX. Para essas interpretações, esses dois sistemas de idéias são baseados na teoria de que a razão humana é um instrumento de verdade e que a ciência é a maior conquista desse modelo de razão humana. Entretanto, em razão de uma série de mudanças ocorridas nas Ciências Naturais, com especial referência à Física, teria ocorrido uma profunda mudança na epistemologia das ciências naturais e sociais. Em conseqüência dessas mudanças, grande parte das teorias do método passaram a sustentar que a razão humana é um instrumento de crítica e que a ciência é um conhecimento tentativo.

A história da ciência parece oferecer evidências de que diversas teorias do conhecimento e teorias sobre a ciência eram concorrentes no século XIX. Contudo, principalmente duas dessas teorias do método científico estavam associadas à idéia que tanto os problemas do mundo natural quanto os do mundo social eram considerados como passíveis de solução: o positivismo e o marxismo. A principal característica epistemológica desses dois sistemas de idéias é que ambos são apresentados como teorias do método do conhecimento verdadeiro.

Ambas as teorias, positivismo e marxismo, são conhecidas por suas teses referentes à dinâmica da realidade social. Nesse sentido elas podem ser consideradas como teorias sociais. Contudo, a fundamentação epistemológica do marxismo e do positivismo implica a idéia que suas teorias do método científico podem ser aplicadas tanto à realidade social quanto à realidade natural. O que aqui se pretende argumentar é que tanto K. Marx quanto A. Comte se envolvem com a questão do método em ciências naturais. Pode-se mesmo afirmar que ambos procuram elaborar a idéia que a ciência, tanto social como natural, é capaz de resolver o problema de identificar um método capaz de conhecer a verdade. Algumas interpretações correntes da teoria do método de análise científica proposta por Marx e Comte pretendem que o marxismo e o positivismo constituem sistemas de idéias produzidos para resolver qualquer problema com o qual o ser humano se depare. De uma forma geral se pode afirmar que essa interpretação do pensamento de Marx se encontra implicada nas diferentes formas de marxismo correntes na segunda metade do século XX.

Uma análise dos fundamentos epistemológicos do Positivismo e do Marxismo, em algumas de suas interpretações mais correntes, pode nos levar à conclusão de que existem estreitas semelhanças entre eles. Colocando a questão mais claramente: em algumas de suas interpretações, positivismo e marxismo apresentam os mesmos fundamentos epistemológicos.

A primeira semelhança entre positivismo e marxismo é expressa em suas teorias da ciência. Ambas as teorias assumem uma visão otimista do conhecimento, isto é, elas estabelecem que a verdade é sempre o resultado da aplicação do método científico de investigação. Elas também estabelecem que a ciência é o que resulta quando se tem um corpo definitivo de verdades. A ciência, portanto, seria o resultado verdadeiro do uso do método positivista, ou do marxista.

Em resumo, tanto o positivismo quanto o marxismo pressupõem a idéia otimista de que o ser humano pode produzir conhecimento verdadeiro. Eles asseguram que, no processo de procurar a verdade, a ciência é a forma mais perfeita de conhecimento. Marx confessa sua confiança no conhecimento científico quando afirma: “Este resumo do desenvolvimento de meus estudos na esfera da economia política pretende apenas demonstrar que minhas idéias, não obstante a forma como elas forem julgadas e o quão pouco coincidam com os preconceitos interessados das classes dominantes, são o resultado de uma investigação conscienciosa e demorada. Mas na entrada para a ciência, como na entrada para o inferno, é preciso impor a exigência: "Aqui toda suspeita deve ser deixada para trás; aqui toda covardia deve perecer.[Dante, Divina comédia].” (MARX, K. "A critique of political economy", in Karl Marx, Selected writings. Oxford, University Press, 1977, p.391)

Augusto Comte declara explicitamente sua confiança no conhecimento científico, a ponto de estabelecê-lo como base de todo o comportamento humano. Ele diz: “Não há dúvida de que o estudo da natureza desenvolvido pelos seres humanos se constitui na única base de sua ação sobre a natureza; pois, somente conhecendo as leis dos fenômenos e, portanto, sendo capaz de prevê-los, é que nós podemos, na vida prática, arranjá-los de maneira a que um modifique o outro para nossa vantagem. Nosso poder direto sobre todas as coisas em nosso redor é extremamente frágil, nós não produzimos algo de grande, é através do conhecimento das leis naturais que nós podemos fazer um elemento agir sobre outro - até mesmo elementos modificadores muito fracos podem produzir mudanças nos resultados de um grande agregado de causas. A relação entre ciência e arte pode ser resumida na breve expressão: "Da ciência vem a previsão: da previsão vem a ação". (COMTE, A. Positive philosophy. London, John E. Taylor, 1853, vol.1, PP. 19-20)

O positivismo e o marxismo podem ainda ser analisados na forma como, em algumas de suas versões, eles interpretam a história. Eles apresentam uma versão do desenvolvimento do tempo histórico em termos lineares. Isto é, ambos, marxismo e positivismo, como teorias da história, interpretam a história como o contínuo progresso da humanidade para a reconquista do "paraíso perdido". Tanto a sociedade final sem classes de K. Marx quanto o industrialismo de A. Comte constituem uma fase no desenvolvimento da humanidade: eles marcam o fim dos tempos pré-históricos e o começo do tempo histórico. Contudo, o aspecto mais característico dessas teorias da história é que elas interpretam a si próprias como um fato histórico imediatamente anterior a esse objetivo final. Isto é, tanto o marxismo quanto o positivismo consideram-se a si mesmos como os fatos históricos responsáveis pela passagem do período pré-histórico para o tempo histórico. Portanto, em suas teorias da ciência e em suas teorias da história, ambos os sistemas - marxismo e positivismo - estabelecem que os seres humanos podem descobrir a verdade. Eles também estabelecem que, usando esse conhecimento, o ser humano pode saber o que está contido no futuro. Assim, homens e mulheres podem prever que a felicidade da humanidade está no futuro.

Esses dois sistemas podem ser considerados, finalmente, como teorias da revolução. Isto é, pressupondo que eles conhecem quais são os objetivos finais da história, eles implicam que é possível estabelecer os caminhos para conquistar o futuro e são unânimes em afirmar que a revolução é o único caminho. O marxismo estabelece que a revolução do proletariado e a conseqüente extinção definitiva da burguesia, isto é a vitória do oprimido sobre o opressor - é a única saída. O positivismo afirma que a revolução moral é o caminho da história. Essa revolução moral resultaria da ação das reservas morais da sociedade. Essas reservas morais estariam na força da classe trabalhadora e, principalmente, no poder das mulheres.

Das idéias acima expostas parece plausível se concluir que esses dois grandes sistemas de idéias do século XIX reconhecem a existência de verdadeiras forças revolucionárias na sociedade e estabelecem a necessidade de ativar essas forças revolucionárias. Ambos, o marxismo e o positivismo, identificam a existência de setores da sociedade que são os responsáveis pelo desencadeamento das forças revolucionárias.

Assim, o proletariado para Marx e a classe trabalhadora e as mulheres para Comte constituem as forças historicamente revolucionárias. Entretanto, essas forças necessitam - em nome do princípio da eficiência: "poupar sofrimento" - ser ativadas e orientadas na luta pela conquista do futuro histórico. Os líderes revolucionários são necessários. Assim, para a teoria marxista, o proletariado necessita dos líderes do Partido Comunista; a classe trabalhadora e as mulheres necessitam da Elite Intelectual responsável pela revolução positiva. Uma das características das referidas teorias da revolução é que elas pressupõem que existem forças cuja atividade consiste em assegurar que o processo revolucionário seja conduzido de uma forma eficiente.

Na interpretação acima exposta, existe uma perfeita integração entre a teoria da ciência, a teoria da história e a teoria da revolução tanto no marxismo quanto no positivismo.

A teoria marxista da ciência estabelece as condições metodológicas da verdade e aponta a explicação histórica como o modelo perfeito de análise científica. A teoria da história, a qual a teoria da ciência estabelece como verdade, afirma que a teoria marxista da ciência é verdadeira, pois que a teoria da ciência é uma conquista histórica do proletariado. Ou seja, a teoria da história estabelece que o proletariado é a classe, social que haverá de sobreviver na história e assegura que a verdadeira ciência é o conhecimento que expressa o interesse daquela classe. Por outro lado, a teoria da revolução afirma que a revolução é um instrumento histórico e científico, porque a revolução transforma a ciência em história. Na análise marxista, a ciência - enquanto conhecimento verdadeiro - é uma conquista do proletariado. O conhecimento científico é que permite a vitória concreta do proletariado sobre a burguesia. O cientista revolucionário é aquele que, ao interpretar o processo histórico, identifica as condições necessárias para uma vitória rápida e menos dolorosa da classe proletária. Assim, os cientistas também têm uma tarefa política, pois que, sendo eles conhecedores da verdade, precisam entender que a verdade tem um significado político, isto é, a libertação do proletariado. Nas mãos desses cientistas deve estar a direção do proletariado.

Esse tipo de circularidade epistemológica também pode ser identificado no positivismo. A teoria positivista da ciência estabelece que a história é o instrumento do conhecimento verdadeiro. A teoria da história afirma que a ciência é conhecimento verdadeiro e indica a revolução como o meio para tornar reais a ciência e a história. Para o positivismo, o cientista também tem uma tarefa política - o cientista é o homem ou a mulher que conhece a verdade, pois que trabalha com a verdade. Então o cientista é alguém dedicado à verdade, tendo, portanto, todas as necessárias virtudes morais. O cientista é o genuíno líder revolucionário. Na análise do positivismo, os valores revolucionários podem ser encontrados na ciência, e é entre os cientistas que se encontram os líderes da revolução.

O ponto central do presente argumento é que, em todos os três aspectos acima considerados, positivismo e marxismo apresentam a mesma base epistemológica. Assim, o positivismo e o marxismo fundamentam a teoria da ciência no pressuposto otimista de que o ser humano pode conhecer a verdade. Eles não consideram a impossibilidade da verdade como um problema. Ambos concluem por afirmar que a ciência é o resultado mais expressivo do conhecimento verdadeiro. No que concerne à teoria da história, ambos os sistemas adotam a mesma metodologia de análise social que permite explicar o passado, posto que torna possível a identificação das leis da história. Em conseqüência disso, as explicações históricas permitem prever o futuro. Da pressuposição de que o futuro pode ser previsto, torna-se seguro falar do sentido da revolução. A revolução é o instrumento de transição para o futuro necessário. Assim, existe uma garantia metodológica de que a revolução é um instrumento histórico. Essa garantia é fornecida pela ciência.

Esta interpretação do positivismo e do marxismo pode ser considerada como uma caracterização geral do fundamento epistemológico das teorias sociais correntes na segunda parte do século XIX e início do século XX. Neste texto não se pretendem discutir todas as interpretações do positivismo e do marxismo. O que aqui se intenta é apresentar uma certa interpretação do marxismo e do positivismo como teorias sociais características do final do século passado e que teriam grande influência na primeira metade do século XX. E mais, almeja-se evidenciar que existe uma total incompatibilidade entre as bases epistemológicas do positivismo e do marxismo assim interpretados e uma certa interpretação dos fundamentos epistemológicos das teorias sociais do século XX.

3.


Nesta parte serão apresentadas algumas críticas gerais aos pressupostos epistemológicos do marxismo e do positivismo nas interpretações acima caracterizadas. Em seguida, procurar-se-á argumentar que novas interpretações sobre as bases epistemológicas das teorias de análise social sugerem a existência de uma nova tendência concernente ao significado do método racional nas Ciências Sociais.

Tanto o marxismo quanto o positivismo parecem admitir o princípio epistemológico de que o ser humano pode identificar teorias verdadeiras ou, em outras palavras, a idéia de que "nós podemos conhecer quando nosso conhecimento é verdadeiro". Acontece que esse princípio é objeto de violentas críticas na moderna teoria da ciência. Esse princípio não é mais considerado um pressuposto de senso comum. Embora não se tenha ainda produzido um argumento decisivo contra esse princípio, contudo, no intuito de evitar algumas conseqüências que esse princípio produz, as modernas epistemologias preferem partir de outros pressupostos. De qualquer forma, esse princípio parece ser demasiadamente problemático para ser tomado como um pressuposto.

Um outro aspecto a ser apontado refere-se ao pressuposto marxista e positivista de que é possível a previsão racional do comportamento social dos seres humanos. Isto se constitui, em nossos dias, em uma questão aberta. As modernas discussões em história estão longe de uma conclusão nessa matéria. As posições podem variar desde a idéia de que existem leis históricas e que o ser humano pode descobri-las e controlá-las até a teoria de que a história é impossível como conhecimento científico. Nesse sentido avançam teorias sustentando que a história não é mais do que uma simples tecnologia social.

Além disso, marxismo e positivismo parecem admitir que a revolução é a única forma de transformar a sociedade. Porém, essa idéia é demasiadamente problemática para ser assumida como um pressuposto. Não existe nenhuma garantia de que esse princípio seja científico. Do mesmo modo, não existe garantia de que, caso fosse científico, esse princípio seria necessariamente verdadeiro. Outro argumento é que as próprias forças sociais que as teorias sociais do século XIX, especificamente o positivismo e o marxismo, indicam como as forças revolucionárias não são facilmente identificáveis nas sociedades modernas, isto é, é difícil identificar o proletariado nas sociedades industriais modernas. Não mais existem claras distinções entre as classes capitalista e trabalhadora ou ainda entre homens e mulheres como forças sociais. O que a teoria moderna da revolução parece estabelecer no século XX é que aconteceu uma profunda mudança na realidade social na passagem do século passado para o atual. A moderna teoria da revolução parece apontar para o fato de que as supostas forças revolucionárias teriam desaparecido.

Outro ponto que pode ser levantado contra as interpretações do marxismo e do positivismo aqui apresentadas refere-se ao caráter subjetivista de suas epistemologias. Isto é, esses sistemas, baseados na tese indutivista de que a partir de experiências feitas no passado é possível se prever o resultado de experiências futuras, concluem pela existência de uma separação entre o subjetivo e o objetivo e pela justificação da prioridade do primeiro sobre o segundo. Embora não o reconheça explicitamente, essas interpretações do positivismo e do marxismo implicam uma distinção entre a interpretação (teoria) e a ação (prática) e avançam a tese de que as coisas devem se submeter às idéias.

O procedimento metodológico dessas teorias consiste em profetizar sobre o futuro tendo por fundamento as experiências feitas no passado. Portanto, essas teorias fixam padrões para o presente. O presente, quando não segue as previsões históricas, é considerado, como uma distorção histórica. Dessa forma, não existem objeções em submeter o presente às exigências teóricas e fazê-lo conformar-se com aquilo que é necessário que o presente seja, para que se garanta o futuro necessário previsto teoricamente.


4.


O ponto central do argumento que se pretende apresentar nesta parte é que uma mudança epistemológica teria ocorrido na passagem do século XIX para o século XX, e essa mudança tornou problemáticos muitos dos pressupostos do positivismo e do marxismo.

Quando A. Einstein estabeleceu a teoria da relatividade, na primeira metade do século XX, o descontentamento com as teorias correntes sobre o método científico começou a se difundir. Em sua estrutura epistemológica, as teorias de Einstein diferiam da Física newtoniana, isto é, Einstein desenvolveu suas teorias antes de experimentos empíricos poderem ser produzidos, e suas teorias eram construídas como proposições conjecturais. Essas características das teorias de Einstein pareciam sugerir que elas possuíam uma fundamentação epistemológica diferente daquelas propostas pelas teorias da ciência do século XIX.

O questionamento crítico das teorias correntes sobre as bases epistemológicas da ciência parece ter começado na Física, para em seguida se espalhar por todas as áreas do conhecimento racional. Essa mudança epistemológica teria produzido uma profunda crise nas ciências sociais e, na segunda metade do século XX, parece ter conduzido a um certo negativismo, uma certa frustração, entre todos aqueles que sonhavam com uma ciência verdadeira e com a racionalidade como fonte de certeza.

Com esse processo de ruptura epistemológica não existe mais fundamento para a teoria de que a ciência é conhecimento verdadeiro. A discussão moderna da teoria da ciência aponta para a fragilidade da estrutura epistemológica da ciência. A experiência de viver soluções científicas tem convencido a muitos de que algumas soluções científicas são inviáveis. Assim, a ciência tem sido exposta a uma violenta crítica; disso resulta que, cada vez mais, suas limitações são reconhecidas e divulgadas. O otimismo epistemológico implícito em certas interpretações do marxismo e do positivismo é hoje considerado insustentável. As novas teorias epistemológicas parecem admitir a idéia de que o ser humano não dispõe de critérios para identificar a verdade. As situações sociais concretas têm demonstrado que o messianismo do proletariado e o caráter redentor da elite científica são mistificações.

A discussão a propósito do método científico no século XX parece ser caracterizada pela procura das regras referentes ao procedimento científico. As posições podem variar desde aqueles que defendem a idéia de que essas regras precisam ser encontradas na análise da reconstrução racional da atividade dos cientistas até a idéia de que essas regras podem ser encontradas na análise da história da ciência. Contudo, o pressuposto comum dessas análises parece ser que o método da ciência é um conjunto de regras que são necessárias para o uso de um tipo específico de razão. Essas epistemologias admitem que o conhecimento científico é o resultado de um certo tipo de racionalidade. Ela se constitui num tipo de discurso cujas regras podem ser devidamente identificadas. Na forma como aqui se caracteriza a passagem do século XIX para o século XX, a moderna epistemologia, à medida que recusa a tese de que o conhecimento racional é necessariamente verdadeiro, implica um novo conceito de racionalidade. A moderna epistemologia implica a idéia de quê a razão não é um instrumento de dogmatismo.


Conclusão


A idéia de que a racionalidade pode ser caracterizada pelo exercício da crítica e a tese de que a ciência somente pode ser obtida por meio dessa forma de racionalidade são aqui apresentadas conseqüências epistemológicas de uma suposta ruptura que teria ocorrido na virada dos XIX e XX. Como conseqüência dessa ruptura, segue-se que nós não mais temos garantias para nossas teorias científicas da história e de nossas teorias científicas da revolução.

Uma suposta reviravolta na teoria da ciência teria quebrado a circularidade, ou mútua justificação, entre as teorias da ciência, da história e da revolução, positivista e marxista. Por todas essas razões, parece que o debate sobre teoria social no século XX não pode ser dissociado da discussão das bases epistemológicas da ciência.

O que aqui se pretende haver demonstrado é que houve uma mudança na teoria da ciência e que a crise da teoria da história e da teoria da revolução no século XX está relacionada com aquela mudança epistemológica, Tudo indica que não existe mais um conjunto de verdades conclusivas referentes à natureza da ciência, a direção da história e o significado de revolução. O que existe em nossos dias é um conjunto de irrefutáveis teorias filosóficas referentes à ciência, um extenso debate a propósito da possibilidade da história como conhecimento científico e uma completa descrença na teoria da revolução total.


Notas e Referências


1. Para esclarecimento do conceito de "paradigma", ver KUHN, T. The structure of scientific revolutions. London, University of Chicago Press, 1970, especialmente o "Postscript - 1969", pp. 174-210.


2. Popper argumenta que sua teoria da ciência não foi estabelecida como uma teoria histórica ou apoiada por fatos históricos ou empíricos. Contudo, ele destaca o poder explicativo que sua teoria da ciência possui, especialmente se comparada com suas concorrentes. Ver POPPER, K. R. Realism and the aim of science. London, Hutchinson, 1985, p. XXI.

3 .Para uma melhor caracterização do que se entende por 'transição', ver o texto de E. Gellner "The role of knowledge", em GELLNER, E. Legitimation of belief. Cambridge, University Press, 1979, pp. 202-208; também o texto de I. G. Melchior "A teoria social da transição", em Nacionalismo e democracia. Brasília, Editora da UnB, 1981, pp. 3-42-, ver ainda, o texto de J. G. Melchior "Ernest Gellner e as liberalizações políticas", em Coleção Itinerários; "Gellner na UnB", Brasília, Editora da UnB, 1981, pp. 5-25. Embora Gellner não use o termo para caracterizar a passagem do século XIX para o século XX, contudo, sua caracterização do fenômeno da "transição" (ou "Transição" como quer Gellner) pode ser inteiramente assumida aqui neste texto.

terça-feira, 16 de março de 2010

CAPÍTULO 10 - História e Conhecimento do Passado

HISTÓRIA E CONHECIMENTO DO PASSADO


“Para resumir, não pode existir história "do passado da forma como ele de fato aconteceu"; somente podem existir interpretações, e nenhuma com caráter final; e cada geração tem o direito de estabelecer a sua própria. Não tem apenas o direito de criar suas próprias interpretações, mas também tem uma certa obrigação de fazê-lo, pois existe uma questão a ser respondida. Nós queremos saber como nossos problemas estão relacionados com o passado, e desejamos ver a linha ao longo da qual podemos progredir para a solução daquilo que sentimos, e que escolhemos, como nossas principais tarefas”.(Karl R. Popper. The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 268).


Introdução


Neste texto, pretende-se apresentar alguns aspectos da teoria do método da história, no sentido de argumentar que ela implica uma interpretação engenharial do tipo de conhecimento que é possível sobre o passado e daquilo que podemos fazer com o conhecimento da história.

A teoria do método em história será reconstruída aqui com base em três posições. Primeiramente, pode-se argumentar em favor da tese de que existem algumas diferenças entre a estrutura das explicações que são construídas em história e a das ciências naturais, pois o modelo de explicação baseado na formulação de uma lei geral ("covering law model of explanation") não pode ser utilizado nas explicações históricas.

A segunda tese é que existem certos aspectos dos fatos históricos que os tornam particularmente importantes para considerações de ordem metodológica. A idéia de que os fatos não podem ser freqüentemente repetidos, e que as teorias históricas têm forte influência no ponto de vista do coletor desses fatos, pode facilmente conduzir à idéia de que as teorias históricas não são testáveis e, conseqüentemente, não são científicas.

Finalmente, aqui será argumentado que as teorias da história, como "interpretações gerais", não são científicas, devido a seu caráter circular e sua irrefutabilidade. Porém, como "interpretações específicas", elas têm algum mérito determinado.

Essas posições serão aqui examinadas para se chegar à conclusão que há sustentação para a tese de que as explicações utilizadas pela história são científicas. Porém, não existe uma ciência histórica propriamente dita. Nesse sentido, a atividade do historiador estaria mais próxima da "engenharia" do que da produção de conhecimento teórico.

No que se refere às explicações históricas, elas são aqui consideradas em termos de "tecnologia social", de forma diferente, portanto, do que haveria de ser
concluído se fosse possível argumentar em favor da existência de uma ciência da história. Isto é, o conhecimento histórico é aqui considerado como um certo tipo de ciência aplicada. Nesse sentido a tarefa dos historiadores pode ser considerada próxima daquilo que fazem os engenheiros. Da mesma forma como ocorre com estes últimos, eles estariam interessados em prognósticos e não em explicações.

Essas teses, embora tenham sido desafiadas em muitas ocasiões, não foram ainda exaustivamente discutidas. Neste texto, pretende-se reforçar a sugestão de que existem boas razões para explorar a "concepção engenharial" do trabalho do historiador e as suas implicações para a metodologia de trabalho em história.


1.


Existem certas limitações à aplicação do princípio da unidade do método científico ao campo da ciência histórica. O que isso significa é que, embora se possa aceitar a tese da unidade de método entre as ciências sociais e as ciências naturais, existem limitações para a tese da identidade de método entre as ciências naturais, as ciências sociais e a história.

Podem ser apresentados dois importantes argumentos para provar que existem diferenças na estrutura da explicação causal em ciências teóricas (tais como a sociologia, a teoria econômica, a teoria política etc.), de um lado, e a ciência histórica, de outro.

Com o primeiro argumento pretende-se demonstrar que (a) a história é caracterizada por seu interesse em eventos atuais, específicos ou singulares, e não em leis ou generalizações.(1)

E, no segundo argumento procura-se demonstrar que: (b)aquelas leis universais que a explicação histórica usa não fornecem um princípio seletivo e unificador, não indicam um "ponto de vista" para a história.

O primeiro argumento (a) apareceu pela primeira vez na obra de K. Popper intitulada “The poverty of historicism”, em 1957. O segundo argumento (b) pode ser encontrado no livro de K. Popper intitulado “The open society and its enemies”, em 1945. Embora tenham sido produzidos em tempos diferentes, é muito difícil separar esses dois argumentos.

Ambos pressupõem uma visão específica da explicação científica. Assim,
dar uma explicação causal de um certo evento significa derivar dedutivamente uma proposição (que será chamada previsão), que descreve esse evento, usando como premissas da dedução algumas leis universais juntamente com certas sentenças singulares ou específicas às quais podemos chamar de condições iniciais. Por exemplo, podemos dizer que demos uma explicação causal do rompimento de um certo fio se sabemos que esse fio seria capaz de suportar um certo peso, e que um
peso maior que esse foi colocado sobre ele.

Assim, os componentes estruturais de uma explicação científica podem ser encontrados no exemplo fornecido acima. Ademais, se analisarmos essa explicação causal, então, notaremos que dois constitutivos diferentes estão envolvidos nela: 1) Assumimos algumas hipóteses que têm o caráter de leis naturais universais; em nosso caso, talvez seja: "sempre que um certo fio é submetido a uma tensão superior, a uma certa tensão máxima, característica para aquele fio em particular, então ele se romperá". 2) Assumimos algumas proposições específicas (as condições iniciais) referentes ao evento particular em questão; em nosso caso, podemos ter duas afirmações: "para este fio, a tensão característica máxima, com que ele poderá se partir, é igual ao peso de um quilo”, “o peso colocado sobre este fio possui dois quilos de peso". Portanto, temos dois diferentes tipos de afirmativas que, juntos, constituem uma explicação causal completa, a saber: 1) proposições universais com o caráter de leis naturais; e 2) proposições específicas referentes ao caso especial em questão, as condições iniciais.(4)

A principal conseqüência metodológica da estrutura das explicações científicas é a dedutibilidade das conseqüências, com base nas condições iniciais. Assim, as leis, juntamente com as condições iniciais, formam as premissas desse silogismo, cuja conclusão é o enunciado que descreve um prognóstico sobre o evento.

Assim, das leis universais podemos deduzir, com a ajuda das condições iniciais, a seguinte proposição específica: "esse fio se romperá". Essa conclusão podemos também chamar de uma previsão. As condições iniciais (ou, mais precisamente, a situação descrita por elas) são costumeiramente chamadas de causa do evento em questão, e a previsão (ou melhor, o evento descrito pela previsão) como o efeito: por exemplo, podemos dizer que colocar um peso de duas libras sobre um fio capaz de suportar somente uma libra teria sido a causa do rompimento do fio.


2.

A posição aqui apresentada parte da idéia de que existe uma distinção fundamental (" ... tão freqüente e enfaticamente reafirmada pelos melhores historiadores...") entre as ciências históricas e as ciências teóricas. Essa distinção consiste em que, enquanto as ciências teóricas estão principalmente interessadas em encontrar e testar leis universais, as ciências históricas consideram seguras todas as leis universais e estão principalmente interessadas em encontrar e testar proposições particulares.(6)

O argumento consiste em afirmar que aquilo que constitui a segunda parte da proposição - isto é, que as ciências históricas consideram seguras todas as leis universais e que estão principalmente interessadas em encontrar e testar proposições particulares - é perfeitamente compatível com a análise do método científico anteriormente apresentada.

Podem ser construídas duas descrições da estrutura lógica das explicações históricas. No primeiro caso, dado um evento singular, as ciências históricas podem buscar as condições iniciais, que juntamente com as leis universais (e Popper acrescenta " ... as quais podem ser de pouco interesse...") explicam o referido evento singular.(7)

No segundo caso, as ciências históricas podem estar voltadas para o teste de uma hipótese particular. Isso significa que essa hipótese singular pode ser usada, juntamente com outras proposições singulares, como uma condição inicial, baseada na qual pode-se recorrer a leis universais no sentido de deduzir alguma previsão nova "... que pode descrever um evento acontecido no passado distante, que pode ser confrontado com a evidência empírica ...... tal como documentos, inscrições etc.” (8)

Isso tudo permite a Popper concluir seu argumento afirmando que “...é somente em história que estamos realmente interessados na explicação causal de um evento particular. Nas ciências teóricas, tais explicações causais são principalmente um meio para diferentes fins - o teste de leis universais.” (9)

Contudo, esse argumento não pode ser tomado como suficiente para demonstrar a existência de uma distinção metodológica entre as ciências históricas e as ciências teóricas, conforme parece ser o que pretende Popper, pois o argumento infere que determinadas características psicológicas dos historiadores seriam suficientes para apontar a existência de certas particularidades da estrutura lógica das explicações em história. Essa inferência parece, contudo, indevida.

O argumento de Popper parece assumir que aquelas características baseadas nos aspectos psicológicos dos historiadores, que procuram por explicações históricas, têm significado metodológico. Quando ele propõe que a história se caracteriza por seu interesse em eventos particulares, ele está descrevendo o mecanismo psicológico que opera quando as pessoas fazem explicações históricas. Isso porque o interesse das explicações históricas depende das intenções das pessoas.

Dessas considerações, pode-se concluir que essa descrição não corresponde à estrutura lógica do conhecimento histórico. Isso significa dizer que, da análise dos mecanismos psicológicos que são utilizados pelas pessoas quando fazem explicações históricas, não se pode concluir que existam distinções metodológicas entre as ciências históricas e as ciências teóricas.

O próprio Popper defende em outra passagem que a distinção entre o uso de uma teoria para o propósito de explicação, ou predição, ou teste, depende de nosso interesse. Ela depende daquilo que consideramos como nosso problema, daquilo que assumimos, ou tomamos como garantido. Não existe diferença na estrutura lógica das teorias usadas para diferentes propósitos.

O ponto central da crítica que aqui se pretende estabelecer ao argumento de Popper consiste em que, quando ele afirma que "a história é caracterizada por seu interesse em eventos singulares", ele está se utilizando de uma descrição do processo psicológico de certos historiadores.

Ademais, ainda que pareça razoável supor que os historiadores não estão interessados na formulação de leis históricas universais, isso não dispensa as explicações históricas de estarem fundamentadas em leis universais. Só nesse sentido se poderia falar em explicações científicas (explicações causais) em história. Como diz o próprio Popper: “... um evento singular é a causa de outro evento singular - que é o efeito apenas em relação a algumas leis universais.”(10)

Portanto, as leis universais são necessárias em qualquer explicação científica. Apesar do interesse que os historiadores têm por eventos singulares, isso não os dispensa da necessidade lógica de recorrer a leis universais. Popper afirma:
“... via de regra, se estamos interessados em eventos específicos e em sua explicação, tomamos como certas as várias leis universais que julgamos
necessárias.” (11)

Dessa forma, se necessitamos de leis universais para produzir uma explicação científica, então, não há fundamento para a afirmativa de que os historiadores usam leis universais, mas estão interessados em eventos particulares. Esse seria um assunto psicológico, sem qualquer significado metodológico.

Essa noção do caráter psicológico das ciências históricas é claramente indicado na seguinte passagem: “Essa visão da história torna claro por que tantos estudantes de história e seu método insistem que é o evento particular que os interessa, e não qualquer lei histórica universal. A generalização pertence simplesmente a uma linha de interesse diferente, que pode ser claramente distinguia daquela que se interessa por eventos específicos e sua explicação causal, que se constitui no interesse da história. Aqueles que estão interessados em leis devem voltar-se para as ciências generalizantes (a sociologia, por exemplo). Nossa visão também torna claro por que a história tem sido tão frequentemente descrita como "os eventos do passado como de fato aconteceram". Essa descrição traz à tona o interesse específico do estudante de história, como oposto àquele de um estudante de ciência generalizadora, apesar de que devamos apresentar certas objeções a isso.” (13)

O que aqui se pretende argumentar é que Popper parece correto quando estabelece que os historiadores não dispõem de leis universais de natureza histórica. Portanto, que os historiadores não se utilizam de leis históricas em suas explicações causais de eventos singulares. As leis são tomadas como certas, sem maiores considerações. Contudo, o argumento não é suficiente para justificar a impossibilidade da formulação das leis históricas. Se essa objeção estiver correta, então, pode-se dizer que o argumento de Popper está correto quando indica o caráter engenharial do conhecimento histórico. Porém, ele se engana em tentar justificar a impossibilidade de leis universais em história, oferecendo a posição insustentável de que isso decorre do interesse manifesto pelos historiadores quando constroem suas explicações causais.

Popper argumenta que os historiadores estão interessados na explicação causal de um evento específico e na descrição de eventos específicos enquanto tais.(14) Desse ponto de vista, os historiadores têm duas tarefas importantes: o desembaraçamento das ligações causais, pela consideração do evento como um fato típico; e a descrição de acontecimentos interessantes, enfatizando a peculiaridade do evento, e descrevendo-o como único. (15)

Nesse sentido, qualquer explicação científica de tendências históricas, e todos os testes de leis históricas, serão excluídos do domínio das ciências históricas.

Parece que o conceito de história implicado no argumento de Popper envolve a posse de habilidades técnicas muito mais próximas das necessárias em engenharia, arqueologia, contabilidade do que aquelas que são úteis na produção de ciência pura. (16)

No argumento, Popper afirma que, em seu procedimento, as ciências históricas pressupõem o caráter instrumental das leis universais. Ele diz: “As ciências históricas, pode-se dizer, não apresentam uma atitude isolada na forma como consideram as leis universais. Onde quer que ocorra uma aplicação da ciência a um problema especifico ou singular, encontramos uma solução parecida. O químico prático, por exemplo, que deseja analisar um certo composto - um pedaço de pedra- dificilmente considera qualquer lei universal. Em vez disso, aplica, provavelmente sem pensar muito, certas rotinas técnicas, que, de um ponto de vista lógico, são testes de uma hipótese singular como a seguinte: "Este composto contém enxofre." Seu interesse é principalmente histórico
a descrição de um conjunto de eventos específicos, ou de um corpo físico individual. (17)


3.


No segundo argumento, se pretende provar que existe distinção entre a função da leis gerais nas ciências generalizantes e nas ciências históricas. O argumento é que, nas explicações históricas, as leis universais envolvidas não fornecem um "ponto de vista" para a história.

Popper inicia alegando que a explicação científica tem caráter seletivo. Ele afirma: “Mesmo a ciência não é um mero "coas de fatos". Ela é, em última instância, uma coleção e, como tal, é dependente do interesse do coletor, depende de um ponto de vista. Em ciência, esse ponto de vista é habitualmente determinado por uma teoria científica; isto é, selecionamos dentre a infinita variedade de fatos, e da infinita variedade de aspectos dos fatos, aqueles fatos e aqueles aspectos que são interessantes porque estão mais ou menos ligados com alguma teoria científica preconcebida.

O argumento é que existe uma infinita riqueza e variedade nos possíveis aspectos do mundo que podem ser estudados. Contudo, temos apenas um número finito de palavras. Assim, toda descrição será sempre uma seleção de fatos que podem ser potencialmente descritos. Não há como evitar essa situação.

Essa situação é comum a todas as ciências. Popper afirma que isso é enfaticamente verdadeiro no caso das descrições históricas. Ele afirma: "Portanto, em história, assim como em ciência, não podemos evitar a necessidade de um ponto de vista". (19)

Popper assegura que existe uma diferença entre a "parte exercida" por um "ponto de vista" em história e aquela exercida por um "ponto de vista" nas ciências naturais. Nas ciências naturais o "ponto de vista" é usualmente representado por uma teoria científica que pode ser testada pela procura de novos fatos. (20) Dessa forma, as teorias fornecem um "ponto de vista" ou determinam o caráter seletivo das ciências naturais. Contudo, isso não é tão simples em história, pois não podem existir leis históricas; as leis que a história eventualmente usa são tiradas de outras ciências, tais como a sociologia, a economia ou a política. Por essas razões, em história, o problema de seu "infinito objeto" está marcantemente presente.

Em história, somos confrontados, muito mais do que nas ciências generalizantes, com o problema de seu "infinito objeto", porque as teorias ou as leis universais da ciência generalizante introduzem unidade, bem como um "ponto de vista"; elas criam, para toda ciência generalizante, seus problemas e seus centros de interesse, bem como de pesquisa, de construção lógica e de apresentação. Mas, em história, não temos essas teorias unificadoras, ou melhor, a totalidade das leis universais triviais que usamos são tidas como seguras; elas são praticamente sem interesse e totalmente incapazes de trazer ordem ao assunto. (21)

A conclusão desse argumento é que, nas ciências históricas, as leis universais que são usadas pela explicação histórica não fornecem um “ponto de vista" para a história. Dessa forma, esse "ponto de vista" só é fornecido em um sentido muito limitado pela natureza do objeto particular em consideração, tal como a história do poder político, a história das relações econômicas, a história da matemática etc.

Antes de examinar algumas das implicações que seguem-se do argumento apresentado, vejamos uma crítica geral do método utilizado por ele quando afirma a existência de limitações à aplicabilidade do método científico em história.
Parece que, em seu primeiro argumento (a), quando alega que a história só se interessa por eventos singulares, Popper se baseia no pressuposto de que não existem leis históricas. No segundo argumento (b), no qual pretende provar que as leis universais envolvidas nas explicações históricas não fornecem um "ponto de vista" para a história, isto é, que não existem leis históricas, ele assume que a história só se interessa por eventos singulares. (22)

A conclusão de Popper para o argumento "b" tem dois corolários. O primeiro refere-se à natureza dos fatos históricos e o segundo volta-se para a natureza das teorias históricas.

4.


Popper argumenta em favor da tese de que "várias teorias históricas são, em seu caráter, muito diferentes das teorias científicas". A razão para isso é que a história sofre limitações muito especiais no que se refere aos fatos a sua disposição, pois: a) os fatos históricos não podem ser repetidos segundo nossa vontade e b) são coletados de acordo com um ponto de vista preconcebido.

Assim, a diferença entre as teorias científicas e muitas teorias históricas consiste em que estas são "teorias não-testáveis". O argumento completo afirma o seguinte: “Agora, é importante constatar que várias "teorias históricas" (elas seriam melhores descritas como quase-teorias) são, em seu caráter, amplamente diferentes das teorias científicas. Porque, em história (incluindo as ciências naturais históricas, como a geologia histórica), os fatos a nossa disposição são frequentemente muito limitados e não podem ser repetidos ou implementados conforme nosso desejo. E eles foram coletados de acordo com um ponto de vista preconcebido; as "fontes" da história registram apenas tais fatos, conforme pareçam interessantes para serem registrados, de forma que a fonte haverá de, frequentemente, conter apenas os fatos que sejam conformes com a teoria preconcebida. E na hipótese de não haver mais fatos disponíveis, será freqüentemente impossível testar essa teoria ou alguma teoria dela decorrente. Tais teorias históricas não-testáveis podem, então, ser acusadas de serem circulares, no sentido em que essa acusação tem sido injustamente feita contra as teorias científicas.” (23)

Esse argumento, contudo, não parece suficiente para a conclusão à que pretende chegar. As restrições sugeridas por Popper em “a" e "b" poderiam ser igualmente referidas a várias teorias científicas. Nesse sentido, diversas teorias científicas poderiam ser tidas como "não-testáveis". Muitas teorias científicas são dependentes de fatos que não podem ser repetidos ou implementados segundo nosso desejo. Existem fatos em biologia, geologia, astronomia, entre outras, cuja ocorrência não dependem de nossa vontade. Ademais, o próprio Popper afirma, em outra passagem, que a ciência não é meramente um "corpo de fatos", mas uma coleção de fatos que dependem do "ponto de vista do coletor". (24) E, dessa forma, todos os fatos em ciência foram coletados de acordo com um "ponto de vista" preconcebido.

Certamente, existem diferenças entre os tipos de fatos para os quais está voltada cada ciência. Mas disso não se segue que os fatos históricos são caracteristicamente diferentes dos fatos dos quais se socorrem as ciências naturais. Portanto, da consideração da natureza dos fatos não nos parece apropriado concluir pela afirmativa de que há justificativa para distinções ou limitações metodológicas às ciências históricas. Contudo, algumas diferenças em seus enfoques certamente influenciaram o desenvolvimento das ciências. É preciso que se constate que algumas ciências se desenvolvem mais facilmente do que outras, porque se envolvem com problemas mais fáceis de resolver. (25)


5.


Popper distingue dois tipos de teorias históricas: as "interpretações gerais" e as "interpretações específicas". Por "interpretação geral", entende-se as teorias históricas não-testáveis, que se caracterizam por serem circulares, isto é, são teorias para as quais os fatos só são anotados se concordam com a teoria. Essas interpretações de fatos históricos só contêm aqueles fatos que já foram interpretados pela teoria preconcebida. A circularidade de tais teorias históricas consiste, portanto, em sua relação com os fatos. Os únicos fatos disponíveis para testar a teoria são aqueles estabelecidos ou escolhidos sob a luz da própria teoria. Portanto, para essas "interpretações gerais", os fatos não podem fornecer base nem para refutação nem para confirmação. Popper diz:
“As interpretações são importantes desde que representem um ponto de vista. Mas vimos que um ponto de vista é sempre inevitável, e que, em história, uma teoria que pode ser testada e tem, portanto, caráter científico só raramente pode ser obtida. Logo, não devemos pensar que uma interpretação geral pode ser confirmada por sua concordância mesmo que seja com todos os nossos registros, pois devemos lembrar de sua circularidade, bem como do fato de que sempre haverá uma variedade de outras (talvez incompatíveis) interpretações, que concordam com os mesmos registros e que raramente podemos obter novos dados, capazes de servir, como os experimentos cruciais em física. (26)

A conclusão do argumento é que deveríamos abandonar a ingênua idéia de que: "...qualquer conjunto definido de registros históricos pode sempre ser interpretado de uma única forma.” (27) Com essa análise, Popper pretende estabelecer bases para sua tese de que as teorias históricas, diferentemente das teorias científicas, deveriam ser consideradas "interpretações gerais". Ele, então, argumenta que tais "interpretações gerais" são circulares ou teorias não-testáveis.

Contudo, o argumento não parece ter sucesso em estabelecer boas razões para as supostas limitações metodológicas das explicações em história. Se aceitamos a tese popperiana de que a falseabilidade das teorias depende de seu caráter lógico, então, por que motivos as teorias históricas não poderiam ser construídas em termos falseáveis? Bastaria que as teorias históricas fossem construídas de tal forma que os requisitos lógicos da falseabilidade fossem satisfeitos. (28)

Popper parece correto quando argumenta que só raramente somos capazes de obter novos dados que sirvam de experimentos cruciais em física. Contudo, não é impossível que esses novos dados sejam encontrados e, de fato, eles têm sido encontrados. Portanto, nada impede que também sejam obtidos experimentos cruciais em história.

Não parece bem sucedido o esforço argumentativo de Popper para provar que existem limitações ou impedimentos lógicos e metodológicos para a construção de explicações científicas em história.

Popper também argumenta que existe um outro tipo de teorias históricas, que ele identifica como "interpretações específicas". Ele admite que as interpretações históricas variam em seu mérito. O que lhes dá mérito é a evidência em favor de cada hipótese histórica singular. Popper diz: ”Pode haver uma quantidade considerável de progresso, mesmo no campo da interpretação histórica. Ainda mais, podem existir todos os tipos de estágios intermediários entre "pontos de vista" mais ou menos universais e as hipóteses históricas específicas ou singulares acima mencionadas, que têm o papel de condições iniciais hipotéticas e não de leis universais na explicação de eventos históricos. Freqüentemente, elas podem ser suficientemente testadas e são, portanto, comparáveis a teorias científicas. Mas algumas dessas hipóteses específicas parecem muito semelhantes àquelas quase-teorias universais que chamei de interpretações, e podem ser classificadas, com elas, como "interpretações específicas". Porque a evidência em favor de tais interpretações específicas possui freqüentemente caráter tão circular como a evidência em favor de algum "ponto de vista universal.” (29)

O argumento afirma que se pode ter progresso no campo da interpretação histórica e que isso é possível porque: a) "Existem sempre interpretações que não estão realmente de acordo com os registros aceitos"; b) "Existem algumas [interpretações históricas] que necessitam de um número de hipóteses auxiliares mais ou menos plausível para que escapem da falsificação causada pelos registros"; e c) "Existem algumas [interpretações históricas] que são incapazes de ligar um certo número de fatos que uma outra interpretação pode conectar e, portanto, explicar". (30)

Contudo, se seguimos o argumento de Popper anteriormente apresentado, "a" parece impossível de acontecer, porque, se assumimos a circularidade das interpretações históricas, então, nunca acontecerá de uma interpretação contrariar os fatos, posto que estes são sempre registrados em concordância com as teorias. Conseqüentemente, a posição "b" será falsa, porque não existirão registros falseadores de uma interpretação histórica. E, finalmente, "c" será também falsa, porque toda interpretação histórica só haverá de considerar como fatos aqueles que ela interpreta e explica como tais.

Como conseqüência de sua teoria da circularidade (ou não-testabilidade) das teorias históricas, Popper defronta-se com o problema de oferecer um critério de escolha entre duas interpretações históricas concorrentes e incompatíveis. Ao fazer isso, ele recorre a uma curiosa distinção entre "interpretação" e "ponto de vista". Popper argumenta que as interpretações históricas podem ser incompatíveis, mas não podem sê-lo quando consideradas como "cristalizações de pontos de vista". O argumento inteiro é o seguinte: “Afirmei que as interpretações podem ser incompatíveis, mas, desde que as considere, meramente, como cristalizações de pontos de vista, então, elas não o serão. Por exemplo, a interpretação de que o homem persistentemente progride (em direção à sociedade aberta ou a outro objetivo) é incompatível com a interpretação de que ele retrocede ou anda para trás. Mas o "ponto de vista" de alguém que examina a história humana como a história do progresso não é necessariamente incompatível com aquele de alguém que a olha como a história do retrocesso; isto é, poderíamos escrever uma história do progresso humano para a liberdade (contendo, por exemplo, a história da luta contra a escravidão) e outra história de retrocesso e opressão humanos (contendo, talvez, coisas como o impacto da raça branca sobre as demais raças); e essas duas histórias não necessitam ser conflitantes; em vez disso, poderiam ser complementares uma da outra, corno o seriam duas visões de uma paisagem vista de dois diferentes pontos.” (31)

Em seu argumento, Popper distingue entre "interpretações" e "pontos de vista", alegando que as primeiras são "cristalizações" dos segundos. Dessa distinção, seria possível estabelecer o critério de distinção entre teorias históricas concorrentes, isto é, ao serem consideradas como meros pontos de vista cristalizados, as interpretações deixariam de ser incompatíveis e, portanto, já não seriam concorrentes. Continuariam como irrefutáveis. (32)

Contudo, o argumento de Popper não satisfaz, porque recorre ao conceito de "cristalização", para dele inferir uma conseqüência de natureza metodológica. Como se esse conceito fosse capaz de expressar uma mudança na natureza das interpretações, de tal forma que interpretações incompatíveis, ao serem tomadas como "cristalizadas", deixariam de sê-lo. No entanto, o argumento não explica como isso é possível.

Daí, pode-se concluir que os argumentos de Popper, estabelecendo limitações metodológicos ao princípio da unidade de método entre as ciências históricas e as ciências naturais, não têm grande sucesso, isto é, Popper não consegue oferecer bons argumentos que, baseados na análise da natureza das teorias históricas, permitam-nos concluir pela necessidade de tais limitações.

Popper insiste no caráter provisional das interpretações históricas. Contudo, isso seria também característico das ciências naturais. Os objetivos que Popper estabelece para as teorias históricas seriam igualmente desejáveis para as ciências naturais. Ele diz: “A coisa mais importante é ser consciente e crítico, do ponto de vista de cada um, isto é, evitar, na medida do possível, preconceitos inconscientes e, portanto, não-críticos na interpretação dos fatos. Em qualquer sentido, a interpretação precisa falar por si mesma; e seus méritos serão sua fertilidade, sua habilidade de elucidar os fatos da história, bem como seu interesse tópico, sua habilidade de elucidar os problemas atuais.” (33)




Conclusão



Neste texto se defendeu a idéia de que existe unidade de método entre as ciências naturais e sociais, isto é, que há unidade de método entre elas. Assim, o método da ciência é único, a saber: o método conjectural por meio de tentativa e eliminação do erro.

Contudo, Popper pretende estabelecer limitações especiais para a aplicação do método das ciências naturais ao campo de estudo das ciências sociais. Assim, a ciência social seria o resultado de uma certa análise parcial associada com análise crítica, isto é, a ciência social resulta de um enfoque tecnológico, ou tecnologia social parcial, ou engenharia parcial.

Essas limitações decorreriam, ainda, das teses que: a) a ciência social não pode usar teorias historicistas, holísticas ou globais; h) os modelos racionais em ciências sociais são completamente diferentes daqueles das ciências naturais; c) as situações sociais podem ser estudadas em termos de "lógica da situação"; e d) a ciência social pode trabalhar com o pressuposto da total racionalidade da ação humana.

Neste texto foi discutida a tese popperiana de que não existe possibilidade da história como ciência pura. A única coisa que podemos obter por meio das explicações históricas é um certo tipo de "interpretações específicas", que expressam um "ponto de vista". O que aqui se sugeriu é que os argumentos de Popper não parecem suficientes para garantir essa posição. Contudo, isto não invalida sua sugestão de que não temos, de fato, uma ciência histórica análoga às demais ciências teóricas.

A posição de Popper parece implicar que o conhecimento científico pode ser distribuído em uma hierarquia onde as ciências naturais estão em primeiro lugar. Elas constituem a ciência de primeira classe. Em segundo lugar, estão as ciências sociais, que empregam o mesmo método das ciências naturais, com algumas limitações decorrentes da natureza de seu objeto e de suas teorias. Em último lugar, estão as explicações históricas, que, juntamente com as explicações tecnológicas, constituem o enfoque tecnológico ou engenharial da realidade. Nesse sentido, a história seria um tipo de engenharia da atividade humana.



Notas e referências


1.POPPER, KARL R. The poverty of historicism. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1974, p. 143.

2. Idem. The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 256.

3. Idem, ibidem, p. 262.

4. Idem, ibidem, p. 262.

5. Idem, ibidem, p. 262.

6. Idem, The poverty of historicism. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1974, pp. 143-144.

7. Idem, ibidem, p. 144.

8. Idem, ibidem, p. 144.

9. Idem, ibidem, p. 144.

10. Idem, The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 263.

11. Idem, The poverty of historicism. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1974, p. 145.

12. Idem, The open society and its enemies. Vol. Il. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 264.

13. Idem, ibidem, p. 264.

14. Idem, The poverty of historicism. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1974, p. 145.

15. Idem, ibidem, pp. 146-147.

16. Idem, The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 263.

17. Idem, The poverty of historicism. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1974, pp. 145-146.

18. Idem, The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, P. 159.

19. Idem, The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 261.

20. Popper compara a importância do "ponto de vista" em história e em física. POPPER, KARL R. The open society and its enemies. Vol. Il. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 261.

21. POPPER, KARL R. The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 264.

22. Popper fornece dois exemplos de explicações históricas, nos quais seriam usadas leis universais triviais, obtidas em diferentes campos que não a própria história. Idem, ibidem., pp. 264-265.

23. Idem, The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 265-266.

24. Idem, ibidem, p. 259.

25. Idem, Conjectures and refutations -The growth of scientific knowledge. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1972, pp. 66-67.

26. Idem, The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 266.

27. Idem, The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 266.

28. Idem, The logic of scientific discovery. Londres, Houtchinson & Co., 1959, p. 86.

29. Idem, The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap.25, pp. 266-267.

30. Idem, The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 266.

31. Idem, The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap. 25, p. 267.

32. Idem, The poverty of historicism. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1974, p. 151.

33. Idem, The open society and its enemies. Vol. 11. Londres, Routledge & Kegan Paul, 1980, cap.25, p. 268.

CAPÍTULO 9 - O Método nas Ciências Sociais

O MÉTODO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS: A ENGENHARIA SOCIAL FRAGMENTÁRIA




Onde é que nos encontramos hoje? Como são justificadas as exigências da ciência? Que motivos racionais existem - se de fato existe algum - para que uma pessoa concorde com as doutrinas da ciência moderna? Será que os que trabalham em outras disciplinas deveriam se esforçar para fazê-las mais parecidas com a ciência; ou será que as pessoas que trabalham em ciência deveriam finalmente capitular e reconhecer que, de um ponto de vista epistemológico, as exigências de seu conhecimento não são mais seguras do que aquelas propostas em qualquer outra área? De um ponto de vista mais geral, quais são as implicações dos trabalhos revolucionários em filosofia da ciência nas últimas três ou quatro décadas, para a conduta de pesquisa nas ciências sociais "puras" e "aplicadas"? (D.C. Phillips.,Philosophy, science, and social inquiry. Oxford, Pergamon Press, 1987, pp. 3-4)


Introdução



A questão posta como tema central deste texto pode sugerir que ele consistirá de uma exposição detalhada dos diferentes métodos empregados em ciências sociais e da apresentação dos resultados de alguma forma de avaliação desses métodos. Entretanto, o leitor não encontrará nele nem uma coisa nem outra.

Este texto procurará seguir o argumento de Popper em que são apontadas algumas dificuldades dos métodos que assumem que é possível conhecer e experimentar a sociedade como um todo. A recusa do método que considera "as totalidades sociais" prepara a posição de que as ciências sociais só conhecem e experimentam fragmentos da realidade social.

Aqui se pretende apresentar uma concepção engenharial de ciências sociais, que estaria presente na tese que o método de análise social implica uma concepção de ciências sociais em que estas estariam muito mais próximas de um conhecimento do tipo empregado em engenharia de obras do que daquele produzido pela física ou química puras. Assim como o engenheiro de obras, o cientista social usa conhecimentos produzidos em diferentes áreas - como a física, a biologia, a química, a economia etc. Embora ele não esteja impossibilitado de produzir teorias "puras", sua tarefa primordial consiste em resolver problemas, em tentar soluções para os problemas sociais identificados. Dessa forma, o cientista social seria caracterizado como um "elaborador de políticas sociais".


1.


As diferenças metodológicas entre as ciências sociais e as ciências naturais decorrem da diversidade de objetos ou problemas a serem estudados; entretanto, os métodos com que cada uma estuda e seus campos são fundamentalmente os mesmos. (1)

De forma geral, o método da ciência é o hipotético-dedutivo, que consiste em oferecer uma explicação causal dedutiva e em experimentá-la pelos mais diferentes meios. O método hipotético-dedutivo corresponde a uma posição intermediária entre o dedutivismo racionalista e o indutivismo empirista. Os racionalistas, que têm em R. Descartes seu principal representante, entendem que a ciência é fruto da capacidade de conhecer da razão humana. Assim, o correto uso da razão levaria necessariamente à verdade. Os empiristas, dos quais D. Hume seria um exemplo, interpretam a ciência como um conjunto de proposições universais cuja fonte é a experiência particular. Assim, asseguram que, principalmente, pela inferência indutiva é que se constrói o edifício do conhecimento científico.

No método hipotético-dedutivo, vamos conceber a ciência como um corpo de conjecturas de caráter tentativo, isto é, a ciência é um conjunto de teorias e hipóteses com o qual pretendemos atribuir um sentido, ou significado, ao mundo natural. A natureza conjectural da ciência é decorrente do fato de que ela é expressa através de enunciados que podem ser testados pela evidência empírica sem jamais adquirirem o caráter de verdade absoluta, ou definitiva. Os enunciados científicos são identificáveis por seu caráter tentativo. Eles contém respostas que são possíveis de serem oferecidas para certos problemas em um certo momento do tempo.

O método hipotético-dedutivo ou, método da construção de hipóteses, é assim chamado porque não consegue certeza absoluta para nenhuma das proposições científicas que experimenta; pelo contrário, essas proposições sempre conservam o caráter de hipóteses de caráter tentativo, ainda que esse caráter possa deixar de ser óbvio. Isto é, mesmo depois de haver superado um grande número de experimentos, de provas e testes severos as teorias científicas continuam a ser meras hipóteses, ou simples respostas hipotéticas para certos problemas.(2)

A ciência, quer seja natural ou social, constitui-se de explicações cuja natureza é hipotética ou presuntiva. O procedimento científico consiste na construção de um conjunto de proposições sobre o problema, através do qual, de determinadas sentenças que descrevem leis universais, juntamente com as proposições particulares que identificam certas condições iniciais, deduzimos um prognóstico, uma predição - a hipótese. O método científico consiste, ainda, em submeter, a teoria à prova, tomando seu prognóstico e confrontando-o com observações experimentais. Havendo acordo do resultado da observação com a predição teórica, toma-se a hipótese como corroborada, ou confirmada; o desacordo implicará na refutação ou falsificação da teoria. Nesse processo, nunca se dará uma prova final que modifique o caráter hipotético dos enunciados científicos.


2.


A estrutura de enunciados hipotéticos que formam a ciência é a mesma para os três tipos de respostas que podem ser dadas pela ciência para um problema. Assim, a ciência pode ser tomada como uma "explicação", ou como uma "predição", ou como uma “experimentação".(3)

Se entendermos como nosso problema encontrar quais são as condições iniciais ou leis universais (ou ambas as coisas) das quais poderíamos deduzir um prognóstico específico, estaremos buscando uma "explicação”. Se considerarmos as leis e condições iniciais como dadas e as usarmos meramente para deduzir o prognóstico, a fim de conseguir alguma informação nova, estaremos, então, buscando fazer uma "predição”, ou previsão. E se tomarmos uma das premissas, quer a lei universal quer as condições iniciais, como problemática e o prognóstico como algo que se há de comparar com os resultados dos experimentos, estaremos em busca da "experimentação", ou teste da premissa problemática.

O resultado da "experimentação" é a seleção das hipóteses que conseguiram superar as experiências ou a eliminação das hipóteses que foram comprovadas como errôneas. A "experimentação" é, portanto, o momento crucial para a ciência, uma vez que é a tentativa de expurgar falsas teorias e apontar nelas os pontos fracos. O objetivo do conhecimento científico é descobrir as teorias consistentes, estabelecer a verdade das hipóteses; para tanto, devemos testá-las o mais severamente possível, tentando demonstrá-las como errôneas e procurando identificar os pontos onde são mais frágeis.

A atitude científica não consiste em procurar verificar uma teoria. A verificação, ou comprovação experimental, é relativamente irrelevante para a ciência. O descobrimento de casos que confirmam a teoria acrescenta pouca informação sobre o status científico de uma teoria, salvo quando esses casos resultam de legítimas tentativas de refutá-la. Portanto, a atitude crítica é fundamental no procedimento científico. Se buscarmos confirmações da teoria, nós as encontraremos; poderemos, até mesmo, criar hipóteses especiais aplicáveis apenas aos casos em que as nossas teorias se virem ameaçadas. Desse modo, é relativamente fácil encontrar provas com elementos comprobatórios de uma teoria. Pelo método de seleção por eliminação, só as teorias mais consistentes serão consideradas como científicas. Isso significa que apenas as mais aptas haverão de sobreviver.

Para a ciência, de forma geral, não tem a menor importância a investigação sobre a origem de nossas presunções, idéias ou teorias. Não importa se provêm de generalização indutiva, dedução, intuição, revelação ou que simplesmente tropecemos nelas. Os instrumentos de conhecimento devem ser entendidos no exercício de sua autêntica função; necessitam ser analisados não apenas na acidentalidade de sua relação com a origem das teorias, mas também em sua funcionalidade como instrumentos de teste e contestação. Essa é a razão pela qual nem a observação, nem a razão, são autoridades. A intuição intelectual e a imaginação são muito importantes, porém, não são dignas de confiança. Elas podem mostrar-nos muito claramente as coisas e, contudo, conduzir-nos ao erro. São indispensáveis como fontes principais de nossas teorias; mas a maior parte de nossas teorias é falsa, de todas as maneiras. A função mais importante da observação e do raciocínio e, ainda, da intuição e da imaginação, consiste em contribuir para o exame crítico dessas "conjeturas audazes, que são os meios com os quais sondamos o desconhecido.(4)

Não podemos confundir as questões de genealogia com as questões de validade. O que podemos assegurar é que nosso conhecimento não evolui sem a presença de teorias ou hipóteses. O que importa para a ciência é a forma como a teoria foi testada.

Esse método se aplica, em especial, às ciências sociais, pois a maioria de seus objetos é constituída de seres abstratos, de construções teóricas, de modelos criados para explicar nossas experiências. A elas se aplica, com maior propriedade, o método dedutivo a partir de hipóteses. Pode-se dizer que esse método é até mais apropriado para as ciências sociais do que para as ciências naturais. O cientista natural não pode dispor de observações diretas quando constrói seus estudos sobre o átomo. Contudo, o sociólogo pode utilizar-se dos conhecimentos intuitivos que tem de si mesmo, quando cria hipóteses sobre os fenômenos sociais. O elemento unificador do método empregado, tanto em ciências sociais como em ciências naturais, refere-se à exigência de que todas as hipóteses sejam experimentadas, isto é, colocadas à prova.

Tanto nas ciências sociais como nas naturais, as hipóteses têm o mesmo caráter, isto é, são proposições proibitivas, que sempre procuram excluir certas possibilidades.

Uma das peculiaridades metodológicas das ciências sociais é que os homens e mulheres, como sujeitos da ação social, são seres racionais. E essa racionalidade influi diretamente nas situações sociais. Em conseqüência disso, pode-se supor que existem elementos de racionalidade em todas as situações sociais. Isso não significa que homens e mulheres atuam socialmente sempre de forma racional, utilizando-se de todos os elementos de informação disponíveis para conseguir um fim almejado. Contudo, comportam-se de maneira mais ou menos racional. Isso nos permite construir modelos racionais de conduta e alimentarmos a expectativa de que esses modelos venham a ser seguidos, com algumas alterações, por homens e mulheres. Portanto, é justificável a crença de que as situações sociais concretas são mais simples que as situações concretas estudadas pelas ciências naturais.(5)

Assim, é plausível a teoria de que, sob certos aspectos, o método hipotético-dedutivo é mais facilmente aplicável às ciências sociais do que às ciências naturais. Dessa forma, só nas ciências sociais são possíveis os experimentos de modelos racionais de conduta.


3.


A questão do método em ciências sociais tem a mesma conotação teórico-prática dos estudos que se referem à epistemologia das ciências naturais. A epistemologia é baseada no pressuposto de que são necessários estímulos de caráter prático para o estudo dos métodos de investigação científica. Aparentemente, as ciências naturais peculiarizam-se por seu caráter prático, pois são justamente as experiências práticas que têm guiado o desenvolvimento da ciência aplicada.(6)

A evolução do conhecimento não é produzida pela busca de resposta para as investigações descomprometidas dos intelectuais; nem se produz gerada pela curiosidade intelectual do cientista. São, porém, os desafios práticos, os problemas de solução premente, aqueles que de fato orientam as especulações teóricas e chegam, até mesmo, a determinar seus limites. Se isso se aplica às ciências naturais, deve também constituir a orientação das ciências sociais. Portanto, a investigação sobre problemas metodológicos só se processa com base na existência de embaraços, impasses ou problemas com os métodos então existentes. Não se verificam investigações descomprometidas com problemas de ordem prática. Portanto, a própria investigação sobre os métodos decorre das dificuldades dos métodos de que dispomos.

Assim, a investigação sobre o problema metodológico, nas ciências sociais, deve inspirar-se em problemas práticos com os quais se depara o investigador. Os problemas de ordem prática surgem de impasses produzidos pelos métodos existentes. Desse modo, a investigação sobre o método das ciências sociais torna-se a discussão dos métodos já existentes, na tentativa de descobrir seus enganos, superar suas deficiências, propondo novas soluções.


4.


Segundo Popper, o método mais indicado para conseguir resultados práticos nas ciências sociais consiste em analisar criticamente "propostas parciais" de explicação dos fenômenos sociais. O procedimento metodológico recomendado consiste em tentar desvendar se determinada ação econômica ou política tenderia ou não a produzir os resultados esperados ou desejados. (7) As teorias sociais devem ser interpretadas como "propostas parciais", como tentativas parciais de compreensão dos resultados inesperados de nossas ações intencionais. Esse ponto de vista é identificado por Popper como "tecnologia social fragmentária".(8)

Nas ciências sociais é adotado o ponto de vista tecnológico na escolha dos problemas a serem analisados. Contudo, isso não significa que os problemas teóricos serão excluídos da preocupação do cientista social. O ponto de vista tecnológico será considerado como indicador dos critérios pelos quais serão escolhidos os problemas sociais mais significativos. A orientação tecnológica, além de nos conduzir na seleção dos problemas a serem tratados, exercerá a função de disciplinadora de nossas tendências especulativas.


5.

A "engenharia social fragmentária" é a metodologia que consiste em provocar mudanças sociais por meio de pequenos ajustes e reajustes nas instituições.(9) Nesse sentido, a expressão "engenharia" é tomada em sentido análogo ao da expressão "engenharia de obras", isto é, indica o conjunto de todos os conhecimentos tecnológicos necessários à execução de uma obra (de seu fim), e da disposição desses meios em função do fim

A expressão "Engenharia social fragmentária" indica o conjunto de teorias sobre como reconstruir e manejar as instituições, assim como a maneira de projetar as que deverão ser estabelecidas. O método da "engenharia social fragmentária" decorre da constatação de que apenas uma minoria de instituições sociais é conseqüência consciente de nossas ações, sendo, portanto, projetada previamente. A grande maioria dessas instituições é resultado imprevisível das ações humanas intencionais

Para o método da "engenharia social fragmentária", as instituições sociais são concebidas de forma instrumental ou funcional, isto é, o "engenheiro de ação gradual" ou tecnologista social procurará dispor dessas instituições com o objetivo de alcançar determinados fins. Essas análises parciais ou "composturas parciais" têm um caráter limitado, pois, as instituições dependem das pessoas para seu funcionamento. Assim, não é possível criar instituições inteiramente seguras, ou seja, instituições cujo funcionamento não dependa, grandemente, de pessoas. Em muitas situações, as instituições reduzirão o grau de incerteza ligado ao elemento pessoal, auxiliando aqueles que perseguem os objetivos que a instituição tem em vista e de cuja iniciativa e saber pessoal muito depende o êxito da mesma instituição.(10)

A "engenharia social fragmentária" é baseada na teoria de que nenhum fim social pode ser atingido abrigando-se o ideal de tomar a sociedade como um todo. Só podem ser alcançados os objetivos que impliquem em ajustes e reajustes, sem se caracterizar pela ambição de controlar as "forças históricas que modelam o futuro das sociedades".


O engenheiro fragmentário sabe, como Sócrates, quão pouco sabe. Sabe que só podemos aprender de nossos erros. Portanto, avançará passo a passo, de forma gradual, comparando cuidadosamente os resultados esperados com os resultados obtidos e sempre atento ante as inevitáveis e indesejadas conseqüências de qualquer intervenção na realidade social; e evitará começar reformas de tal complexidade e alcance que o impossibilitem de desemaranhar causas e efeitos, e de saber o que, em realidade, está fazendo.(11)

Dessa forma, a "engenharia social fragmentária" é a orientação que nos permite compreender e controlar a imprevisibilidade do fator humano dentro das sociedades. As instituições sociais se alteram e sofrem a influência direta dos impulsos humanos, que fazem com que elas se desenvolvam em direções imprevisíveis. A posição de Popper implica que esse é o único caminho para tratar a sociedade sem a necessidade de violentá-la, impondo-lhe uma planificação ou um sentido que não lhe, pertencem.


6.


Do acima exposto, pode-se concluir que as ciências sociais se referem a aspectos selecionados da vida social. A totalidade das propriedades ou aspectos de uma coisa e, especialmente, todas as relações que suas partes componentes mantêm entre si não podem ser objeto de conhecimento científico.

De fato, é impossível observar e descrever todos os aspectos do mundo inteiro ou mesmo de um de seus objetos. Pois, ao tomá-lo como separado do todo, portanto, isoladamente, estamos tomando-o como um todo e, desfazendo-o das relações que o mantêm como parte do todo de onde é extraído. Toda descrição é, necessariamente, seletiva. Se quisermos estudar uma coisa, somos obrigados a selecionar certos aspectos dela, somos conduzidos a escolher certas propriedades ou determinados aspectos especiais do objeto, e assim passamos a tomá-lo como uma estrutura organizada. Um objeto de estudo científico não pode ser um todo, no sentido de "totalidade".

Nesse sentido, o objeto de estudo das ciências sociais não são os "todos sociais". As totalidades sociais, entendidas como a estrutura de todos os acontecimentos sociais, são demasiadamente complexas para poderem ser abarcadas em uma única análise. Portanto, seria logicamente impossível tratá-las por meio do conhecimento científico. Assim, não se conhece um só exemplo de descrição científica de uma situação social concreta, em sua totalidade. O que somos capazes de produzir são análises parciais, "propostas parciais" ("composturas parciais"), que procuram destacar um aspecto selecionado de um determinado contexto.(12)O que se quer dizer é que os experimentos sociais em grande escala, isto é, abrangentes de totalidades sociais, são extremamente inadequados. Isso pelas razões que analisamos a seguir.

Os experimentos de "todos sociais" desconhecem as experiências fragmentárias, pois, os experimentos de "todos sociais" passam, superficialmente, sobre as experiências fragmentárias, que são fundamentais para todo conhecimento social, tanto científico como pré-científico. Os supostos experimentos sociais abrangentes de totalidades sociais não levam em consideração o fato de que aprendemos muito sobre a vida social com base na análise de pequenos experimentos. Há uma série de experimentos fragmentários realizados, no mais das vezes, em escala pré-científica, com objetivos nitidamente práticos, mas que denotam um conhecimento tecnológico dos acontecimentos sociais. São conhecimentos adquiridos por um método pré-científico, uma vez que carecem de atividade sistemática, orientados apenas pela necessidade de superar alguma dificuldade prática.(13)

Assim, existe uma notável diferença entre o homem de negócios, o general, o professor experiente e aquele que não possui experiência. Essa diferença é, no mais das vezes, decorrente de experiências especiais vividas pelos indivíduos e da reflexão crítica sobre os resultados desses experimentos.

Existe, portanto, um conhecimento adquirido não só por meio da experiência vivida, mas, também, por meio da reflexão e da observação. Assim, a atitude de um vendedor que raciona seus produtos, para conseguir melhores preços com o aumento da demanda do mercado, tem esse conhecimento adquirido de experiência e observação. Faz-se necessária, também, a reflexão, para que ele retire conhecimentos da observação, do acontecer espontâneo dos fatos e aplique-os nas experiências subseqüentes. E, em alguns casos, nada impede que esses conhecimentos sejam adquiridos da forma sistemática e crítica que caracteriza a metodologia científica. Assim, é quase imperceptível a passagem do procedimento pré-científico para o científico.

Essas idéias teriam levado Popper a afirmar: “Segundo esta opinião fragmentária, não existe uma divisão claramente delineada entre a atitude pré-científica e a experimental científica, ainda que a aplicação, cada vez mais consciente, de métodos científicos, quer dizer, críticos, seja de grande importância. De ambas as atitudes, pode-se dizer que empregam fundamentalmente o mesmo método de ensaio e erro. Ensaiamos, isto é, não só registramos uma observação, tentamos ativamente resolver alguns problemas mais ou menos práticos e definidos. E progredimos unicamente se estivermos preparados para aprender de nossos enganos, reconhecer nossos erros e os utilizarmos criticamente, em vez de perseverar dogmaticamente neles. Ainda que essa análise possa parecer trivial, descreve, creio eu, os métodos de todas as ciências empíricas. São justamente os problemas de ordem prática que nos levam a ensaiar hipóteses, teorias, e submetê-las à experimentação. As questões práticas que surgem é que nos induzem à elaboração de ensaios provisórios, que devem ser criticados a fim de identificarmos sua falsidade e assim percebermos os erros que sempre cometemos. Todas as teorias são ensaios, hipóteses provisórias, lançadas para verificarmos se são válidas e nossa atitude diante delas é de crítica, com a intenção de desvendar seu erro”.(14)

A passagem do conhecimento pré-científíco para o conhecimento científico estaria na atitude crítica que caracteriza este último. A atitude crítica realiza-se na busca para detectar conscientemente o erro e eliminá-lo.

Portanto, pode-se concluir que toda experiência de totalidades sociais desconsidera o caráter fragmentário das individualidades que a compõem. Para abranger a totalidade, ela é obrigada a simplificar os problemas, eliminando as diferenças individuais. Destruindo a diversidade de mentes, aniquilando a possibilidade da livre expressão do pensamento, especialmente do pensamento crítico. Dessa forma, as experiências de totalidades sociais impossibilitam o próprio conhecimento científico, pois, como atitude metodológica, implicam na supressão da liberdade de crítica.

Os experimentos de "todos sociais" não significam avanço do conhecimento, pois, as experiências de totalidades sociais, na medida em que são possíveis, não contribuem muito para a soma de nossos conhecimentos experimentais. Só podemos falar em experiência de totalidades sociais se considerarmos a experiência no sentido de "ação cujo resultado é incerto" e não no sentido de "uma forma de adquirir conhecimento por meio da comparação dos resultados obtidos com os resultados esperados".(15)

Essa posição contém uma crítica explícita a certas teorias do método em ciências sociais que concebem a realidade social como dotada de existência própria, independente da existência dos indivíduos que a compõem. Como exemplo de tal concepção, pode-se citar a proposta de E. Durkheim. Ele diz:”Ora, o grupo está constituído de maneira diferente do indivíduo, e as coisas que o afetam são de outra natureza. Representações que não exprimem nem os mesmos sujeitos nem os mesmos objetos não poderiam depender das mesmas causas. Para compreender a maneira pela qual a sociedade vê a si mesma e ao mundo que a rodeia, é preciso considerar a natureza da sociedade e não a dos indivíduos”.(16)

Em outra passagem, E. Durkheim afirma de forma categórica:”Se a síntese sui generis que constitui toda sociedade desenvolve fenômenos novos, diferentes daqueles que se passam nas consciências solitárias (ponto cuja admissão já alcançamos), concorde-se também que a sede de tais fatos específicos é a própria sociedade que os conduz, e não as partes desta, isto é, seus membros. Tais fatos são, pois, nesse sentido, exteriores às suas consciências individuais consideradas como tais, do mesmo modo que os caracteres distintivos da vida são exteriores às substâncias minerais que compõem o ser vivo. Não é possível reduzi-los a seus elementos sem entrar em contradição, uma vez que, por definição, neles está pressuposto algo mais do que os elementos que contêm.(17)

E. Durkbeim parte de uma dissociação fundamental entre o indivíduo e a sociedade. Os fatos sociais não são coisas materiais, mas “constituem coisas tais como as coisas materiais, embora de maneira diferente", conforme afirma em As regras do método sociológico, pp.XX e XXI. Os fatos sociais não são, pois, coisas; não devem ser classificados em determinada categoria do real, mas necessitam ser tratados por certa atitude mental. Suas propriedades características não podem ser descobertas pela mais atenta das introspecções. Para compreendê-los, o indivíduo deve aceitar a condição de sair de si mesmo, por meio da observação e experimentação. O fato social é, portanto, exterior ao indivíduo. E. Durkheim, procurando expressar de modo claro sua posição, declara que é fato social toda maneira de agir, fixa ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou então, ainda, é geral na extensão de uma sociedade dada, apresentando existência própria, independente das manifestações individuais que possa ter.(18)

O fato é que, as experiências de totalidades sociais nos impedem de identificar quais os resultados de uma certa medida, ou de uma intervenção determinada. Dessa maneira, se somos capazes de atribuir um determinado resultado a uma determinada medida, somente podemos fazê-lo se possuirmos um conhecimento teórico adquirido anteriormente e não proveniente do experimento de totalidades sociais em questão.

E. Nagel, embora utilizando-se de diferente argumento, parece concordar, neste ponto, com a análise aqui desenvolvida. Ele afirma que normalmente nos utilizamos de duas classes de termos, sempre que, na investigação social, buscamos descrever os seres humanos e suas condutas. Assim, temos os termos que se referem aos seres humanos individuais e ainda os termos designativos de grupos de seres humanos e atributos característicos de tais grupos ou formas de organização ou, ainda, das atividades manifestas por esses grupos. Contudo, a utilização dos termos coletivos ainda se constitui num ponto de discórdia entre os cientistas sociais. Isso seria particularmente válido quando se interrogam sobre questões referentes ao que designam, se é que designam algo, quando investigam sobre se os termos coletivos são definíveis mediante termos individuais. Dessa forma, o emprego de termos coletivos ou definidores de totalidades, na análise social, é assunto polêmico.(19)

No caso dos experimentos de "todos sociais", entretanto, estamos impossibilitados de identificar exatamente quais os resultados de uma medida específica. O máximo que podemos fazer é atribuir "a totalidade dos resultados" à "totalidade das medidas".

Ademais, o método fragmentário é um instrumento muito mais eficiente. Pode ser usado com ampla facilidade para identificação e combate dos maiores e mais urgentes males de nossa sociedade. Permite-nos uma luta definida contra formas concretas de injustiça e exploração. Pelo método das "propostas parciais" podemos, por exemplo, identificar a fome e a miséria como males a serem sanados. Esse método não nos dispersa num universo de modelos ideais e distantes voltados para o "bem último" ou para a "sociedade perfeita". Por meio dele, o fracasso e o erro são mais facilmente identificados.

Popper argumenta que, da mesma forma que a infra-estrutura composta pelas máquinas de uma empresa pode ser entendida como resultado de pequenos arranjos e correções nos diferentes aspectos do processo mecânico de produção, também o planejamento do processo produtivo é o resultado de intervenções setoriais e intermitentes. Assim: “Pode-se admitir que as máquinas físicas possam ser planejadas com êxito mediante modelos e planos detalhados e, com elas, uma fábrica inteira para sua produção etc. Porém, tudo isso é possível só porque muitos experimentos fragmentários foram levados a cabo de antemão. Cada máquina é o resultado de muitas pequenas melhoras. Cada modelo tem de ser "desenvolvido" pelo método de ensaio e erro, por incontáveis pequenos reajustes. O mesmo vale para a planificação de uma fábrica. Esse plano, aparentemente holístico, só pode ter êxito porque já cometemos toda sorte de pequenos enganos; de outra forma seria de esperar que tal espécie de planejamento levasse a erros sérios”.(20)

Uma vez estabelecida a proposta de que não se dão experimentos de totalidades sociais, surge a questão de como aplicar o método experimental nas ciências sociais. A interpretação aqui exposta implica na idéia de que é impossível a reprodução de experiências sociais exatamente equivalentes. Ao procedermos a um experimento social de dois fenômenos, ainda que se possa descrever as condições de semelhança, há uma série de fatores cuja ação sobre os experimentos não podemos descrever com exatidão e, conseqüentemente, nada podemos dizer de sua importância na reprodução da experiência. Só existe uma forma de detectarmos logicamente a existência de condições semelhantes entre os experimentos sociais. Esta forma é a experimentação. Só fazendo as experiências podemos constatar se duas experiências são equivalentes.

E' impossível identificar, a priori, a importância e a influência de determinados fatores sobre a experimentação. Assim, a variabilidade das condições sociais, conseqüência inevitável do fator temporal, influencia fatalmente as experiências sociais. Porém, isso não torna inviáveis as experiências sociais. Só a experiência pode nos assegurar qual a influência que a mudança (variação) das condições sociais exerce sobre a experiência. A própria afirmação de que a variação das condições sociais influencia fatalmente as experiências sociais é uma proposição sujeita à experiência.

Em diferentes (variáveis) condições sociais, poderemos obter diferentes experiências sociais. Isso, contudo, não destrói o caráter científico das experiências sociais. Esse caráter depende da forma como se concebe a ciência. Se entendermos a ciência como teorias e presunções que se criticam, e sustentarmos que o conhecimento científico caminha pelo método do ensaio e erro, podemos assegurar que a discrepância entre o resultado esperado e o resultado obtido não invalida a possibilidade da experimentação. Isso porque, no mais das vezes, fazemos as previsões dos resultados baseando-nos apenas em nossas experiências mentais.

É pelo poder imaginativo que podemos criar nossos ensaios. A falsificação de nossas teorias aprimora nossa habilidade de interpretar as condições sociais. Assim, é possível resguardar a validade científica das proposições da ciência social. Para isso, contudo, devemos adotar uma determinada noção de ciência. Um grande número de experimentos sociológicos muito desejáveis permanecerão um sonho durante muito tempo, apesar de não serem de caráter utópico, mas fragmentário. Na prática, o sociólogo tem de confiar, muitas vezes, em experimentos levados a cabo mentalmente e em uma análise de medidas políticas levadas a cabo sob condições e maneiras que deixam muito a desejar do ponto de vista científico.(21) Entretanto, essas teorias também se aplicam ao papel da experiência nas ciências naturais. Também nestas, a experiência e a observação não são os elementos que fornecem validade ou determinam a certeza do conhecimento científico. Elas são instrumentos indispensáveis na busca do controle das especulações teóricas, do estímulo à busca de uma hipótese resistente aos testes experimentais, e da prova das teorias, para detectar os nossos erros.


7.


O fato de que os fenômenos sociológicos parecem estar condicionados aos períodos históricos constitui um problema para a construção de leis sociológicas.
Somos inclinados, naturalmente, a considerar como leis, válidas para todas as sociedades, as regularidades, a constância de costumes, que observamos nas sociedades em que vivemos. Contudo, desconsideramos que, no mais das vezes, essas são características aplicáveis apenas a nossa sociedade e a nosso dimensionamento temporal. Assim, podemos incorrer no erro de estender as experiências sociais passadas, com todas as suas implicações, aos experimentos futuros, de cuja existência nada mais sabemos que sua mera possibilidade. Em decorrência disso, podemos transformar em leis, supostamente universais, os resultados de experiências que realizamos em nosso tempo.

Contudo, esse aspecto do problema, cujas implicações teriam sido postas de forma exagerada pelos historicistas, não é insolúvel. É fato que não podemos escapar do dimensionamento temporal dos acontecimentos sociais. Entretanto, do ponto de vista lógico, há um expediente de grande validade na resolução dessa questão: a capacidade inventiva do cientista, a invenção científica.

Além do mais, tal dificuldade não é peculiar das ciências sociais, é também aplicável às ciências naturais. Porém, nem por isso podemos afirmar que o dimensionamento temporal se constitui em fator impeditivo das ciências naturais. O fato é que não existem empecilhos lógicos para a elaboração de leis sociológicas que sejam aplicáveis a diferentes períodos. Se é certo que existem dificuldades para conseguir superar o dimensionamento temporal dos fatos sociais, isso é igualmente válido para as ciências naturais.

Nas ciências naturais é que encontramos os exemplos mais notáveis da capacidade inventiva do cientista. Por exemplo, os estudos de Newton sobre os corpos livres da influência da gravidade.(22)

Ademais, se o condicionamento temporal é responsável por alguma conseqüência epistemológica nas ciências sociais, o mesmo se passa nas ciências naturais. As leis científicas conservam a mesma natureza tanto em umas como em outras. É impossível assegurar a validade universal de nossas formulações científicas. Ainda que devamos tomá-las como presuntivamente válidas de forma universal. O método científico resulta na identificação de leis ou proposições com as quais pretendemos estabelecer as regras que controlam os eventos naturais de forma necessária. Se admitíssemos leis que estivessem sujeitas à mudança, nunca poderíamos explicar a mudança com leis. Equivaleria à admissão de que toda mudança é simplesmente milagrosa. E seria o fim do progresso científico, porque, se se chegassem a fazer observações inesperadas, não haveria necessidade de rever nossas teorias: a hipótese ad hoc de que as leis mudaram "explicaria tudo”.(23)


8.


Certamente, que existem algumas restrições a certas áreas das ciências sociais. Assim, embora as leis das ciências naturais, como as das ciências sociais sejam, em sua natureza, hipóteses, nem todas as hipóteses podem ser apresentadas como leis. As hipóteses históricas e uma série de hipóteses sobre o processo social global são proposições particulares, e não universais, sobre um acontecimento individual ou sobre uma série determinada de acontecimentos. Por exemplo, a hipótese evolucionista de Darwin.(24)

A sociedade humana existe no tempo, isto é, dentro do processo histórico. Contudo, a descrição desse processo não é uma lei universal, e só pode ser expressa numa proposição particular, singular. As leis são proposições que se referem a todos os processos de uma classe determinada. Ora, o processo histórico de evolução da sociedade é único. Disso se pode concluir que não existem leis do processo de evolução da história nem leis da história.

Não podemos elaborar uma lei aceitável pela ciência se sempre nos encontramos na observação de um só e único caso. É certo que, com base em uma só experiência, podemos propor uma hipótese e chegar à formulação de uma lei universal. Porém, até que essa nova proposta seja experimentada em novos casos, não podemos tomá-la como uma contribuição séria para o conhecimento científico.(25)

Essa posição poderia ser contraposta à teoria de que o processo histórico não é único. Por meio da doutrina da periodicidade de ciclos históricos poder-se-ia viabilizar a comprovação experimental das hipóteses e das leis sociais universais referentes ao processo histórico. Essa posição teria, entretanto, de responder à alegação de que não se dá a repetição de momentos históricos. Cada fato social acontece em circunstâncias diversas, e cada caso sofre a influência de sua localização no próprio processo de repetição, isto é, ele seria influenciado pelas repetições anteriores e certamente influenciaria as repetições posteriores. Além do mais, a teoria da periodicidade dos cicios históricos se constrói de tal forma que se torna impossível testá-la. Os fatos seriam selecionados conforme os critérios da própria teoria que deveriam colocar em prova. Esta teoria somente pode ser comprovada pelos fatos e nunca falseada por eles. Seria uma daquelas teorias sem falseadores potenciais. E, portanto, não-científica.

Um outro argumento que poderia ser contraposto à essa posição sugere que podemos discernir e extrapolar a tendência ou a direção de um movimento revolucionário do todo social.(26)Esse argumento se fundamenta na teoria de que os objetos das ciências naturais e sociais são análogos. E como nas ciências naturais as predições são componentes lógicos de seus sistemas, acredita-se que tal também se aplique às ciências sociais.

Esse argumento, entretanto, é falso, pois a analogia dos objetos das diferentes ciências não é tão extensa quanto o argumento implica. As ciências naturais partem de sistemas estacionários e fazem predições dinâmicas a longo prazo. É o caráter estacionário do sistema que permite ao cientista natural fazer predições futuras. E pelas razões anteriormente consideradas, o mesmo não pode ocorrer nas ciências sociais.

As ciências sociais consideram sistemas que não são estacionários nem repetitivos. Isso é particularmente válido se considerarmos que é justamente nos sistemas não-repetitivos que importaria prever o movimento evolucionário. O máximo que se pode conseguir é dimensionar conjuntos de aspectos selecionados. Não podemos, portanto, captar a evolução de aspectos multidimensionais da sociedade. São considerações como essas que teriam levado Popper a afirmar:
“A esperança, em especial aquela de que, um dia, possamos encontrar "leis do movimento da sociedade", da mesma forma como Newton encontrou as leis do movimento dos corpos físicos, não é mais do que o resultado desses mal-entendidos. Visto que não existe, numa sociedade, movimento em sentido semelhante ou análogo ao do movimento dos corpos físicos, não podem existir tais leis.”(27)

É possível concluir que é válido supor a existência de tendências relativas ao processo de desenvolvimento histórico das sociedades. Mas as tendências não são leis. Uma proposição que afirme a existência de alguma tendência é existencial e não universal. Ela estaria propondo a existência de uma tendência em determinado espaço e tempo, seria, portanto, uma proposição histórica singular. Além do mais, estaria simplesmente afirmando um fato e não proibindo um evento, como é a exigência lógica de uma lei universal. Com base em leis universais, podemos fazer predições de acontecimentos. Contudo, ao considerar tendências, não podemos prever acontecimentos particulares. De igual forma, de uma tendência não podemos concluir por uma lei. De qualquer sucessão de acontecimentos tomados da natureza, de qualquer seqüência de fatos concretos, não se pode encontrar a conexão causal entre eles, expressa em uma única lei da natureza. Se dois ou mais fatos estão relacionados entre si por uma conexão causal, essa relação não pode ser descrita por uma só lei nem mesmo por um único grupo de leis com características especiais para tal caso. A ação dos fatores que determinam tal conexão é inexprimível em sua totalidade lógica. Da mesma forma, como não são as tendências que validam as leis, não existem leis que determinem o caráter dinâmico das tendências.


9.


Todas essas considerações implicam a idéia que há distinção entre leis e tendências. Um acontecimento específico só é explicado na sua relação causal se de sua explicação for possível deduzir uma proposição que descreva esse acontecimento. Essa proposição teria de ser inferida das seguintes premissas: de um lado, algumas leis universais e, de outro, algumas proposições particulares que descrevam as condições iniciais específicas relativas ao caso em questão.

Seria um exemplo de explicação científica a seguinte afirmação: para cada fio de uma mesma estrutura dada, determinada pelo material de que é feito, por sua espessura etc., existe um peso característico P, tal que o fio se partirá se um peso maior que P for suspenso nele. Se, num fio de estrutura E1, o peso característico P é igual a 1kg, e um peso P2, igual a 2kg, for dependurado nele, o fio se romperá.(28)

A estrutura dessa explicação é composta de proposições singulares, que descrevem as condições iniciais específicas: "este fio tem uma estrutura E1" e "o peso suspenso no fio foi um peso de 2Kg”. Isto posto, podemos deduzir, das leis universais e com a ajuda das proposições que descreviam as condições iniciais específicas, a seguinte proposição: “o fio se romperá”. Essa é a conclusão, é o efeito, o prognóstico, ou a previsão científica.(29)

C. Hempel apresenta uma visão semelhante, porém mais detalhada da estrutura das explicações científicas. Ele diz: “Caso as leis relevantes sejam explicitamente formuladas, a explicação resultante pode ser apresentada sob forma de um argumento dedutivo, no qual a ocorrência do evento em questão é inferida a partir de um conjunto de premissas que especifica (i) as leis relevantes e (ii) as circunstâncias antecedentes particulares que se diz, em termos comuns, terem sido a causa do acontecimento. Nossa explicação da dilatação do fio de cobre, por exemplo, assumiria a forma de um argumento com duas premissas: (i) a lei geral segundo a qual todo fio de cobre toma-se mais longo quando sua temperatura se eleva e (ii) o enunciado de que dado fio era feito de cobre e de que sua temperatura sofreu elevação. Dessas premissas decorre, dedutivamente, a conclusão de que o fio se estendeu em comprimento, que é o fato a ser explicado. Assim, o enunciado explicativo de que a dilatação do fio foi causada pela elevação da temperatura é substituído por um argumento no qual já não aparece a palavra "causa" ou seus cognatos. Nesse argumento se diz, resumidamente, que dado fio de cobre foi aquecido e que todos os fios de cobre, quando aquecidos, dilatam-se; e que, portanto, o dado fio de cobre dilatou-se.(30)

Essas exigências têm de ser satisfeitas para que se tenha uma explicação científica. Do que se conclui que não se dão causas ou efeitos de modo absoluto. O ato de predizer um acontecimento é apenas decorrente da aplicação das leis científicas nas condições preestabelecidas. Nessa formulação, estaríamos usando o conhecimento científico para explicar um acontecimento particular.

Contudo, a explicação causal de regularidades descritas por uma lei universal implica em novas exigências. A explicação causal de uma regularidade consiste em deduzir uma lei (que contém as condições sob as quais tem validade a regularidade proposta) de um grupo de leis mais gerais, que tenham sido experimentadas e confirmadas independentemente.(31)

As regularidades podem adquirir consistência lógica de "quase leis dinâmicas" e, inclusive, serem utilizadas como base para predições. Mas não se deve esquecer que isso só será possível, isto é a sua validade depende da persistência de certas condições iniciais. Não possuindo, portanto, a mesma natureza das leis, cuja característica é a universalidade incondicional.


10.


Nas interpretações da realidade social que construímos não se dão tendências ou regularidades logicamente absolutas. Disto se pode concluir que não se justificam previsões incondicionais. Se elas existissem, teriam o caráter de profecias. Porém, as predições científicas são sempre condicionais, visto que são vinculadas às condições iniciais específicas. Toda classe de tendências está vinculada a um conjunto de condições específicas. Se fosse possível descrever o conjunto de condições específicas de todas as tendências, então, seria possível prever tendências. Ora, isso é impossível.

Chegamos, portanto, à conclusão de que as tendências são condicionais. É difícil a tarefa de determinar as condições em função das quais as tendências persistem. Talvez seja mais fácil descobrir as condições sob as quais elas não sobrevivem. De fato, existem incontáveis possíveis condições e, para poder examinar todas as possibilidades em nossa busca da verdadeira condição de uma tendência, devemos tentar imaginar, a cada momento, as condições sob as quais a tendência em questão desapareceria.(32)

Portanto, toda análise em ciências sociais parte de problemas e se desenvolve com base na experimentação de possíveis soluções para estes e para os demais problemas que, porventura, apareçam no decorrer da investigação. É por meio de tentativas experimentais para resolver nossos problemas, por meio de conjecturas controladas pela mais severa crítica, que se desenrola o desenvolvimento das ciências sociais.(33)


Conclusão


A teoria do método das ciências sociais, aqui proposta, é fundamentada no "individualismo metodológico", isto é, ela se baseia na teoria de que os comportamentos e as ações das coletividades são expressão do comportamento e das ações individuais.(34)

Outro fundamento dessa posição é a teoria de que homens e mulheres são condicionados pelo meio social. Contudo, também os fenômenos sociais são resultado de ações e decisões humanas. Ainda que, nem sempre, eles sejam os resultados de ações humanas conscientes e intencionais. Freqüentemente, as ações humanas produzem conseqüências involuntárias e indesejáveis.(35)

A tarefa das ciências sociais consiste em tentar identificar e analisar as conseqüências das ações humanas dentro do quadro das instituições e tradições sociais. Consiste em procurar descrever as repercussões involuntárias das ações humanas intencionais.

Para a compreensão das conseqüências das ações humanas, devemos recorrer às situações em que estas ocorrem. É necessário, portanto, que procuremos penetrar na "lógica da situação". Os fenômenos sociais são sempre o resultado das decisões, ações e atitudes dos seres humanos. É possível a compreensão objetiva de um fato social. A isto Popper chama de "lógica da situação": a ação se faz compreender em seu contexto de situação social. Para tanto, é necessário destituir a ação de todo seu significado individualista ou psicológico, isto é, todos os aspectos que constituem a explicação do fato devem ser convertidos em elementos da situação.(36)

A "lógica da situação" constitui-se de explicações racionais e teóricas dos fatos sociais. A "lógica da situação" é formada por "composturas parciais", que se caracterizam por ser teorias-tentativas, altamente criticáveis e sujeitas a palpáveis melhorias. Esse é o método das ciências sociais, que nos permite compreendê-las dentro dos moldes críticos da ciência contemporânea.


Notas e referências


1. Popper afirma: "Não pretendo afirmar que inexistam diferenças entre os métodos das ciências teóricas relativas à natureza e à sociedade; essas diferenças são claras e se manifestam até mesmo entre as diferentes ciências naturais, bem como entre as diferentes ciências sociais. (Comparemos, por exemplo, a análise de mercados competitivos e de línguas românticas.) Concordo, porém, com Mill e Comte - e com muitos outros autores, entre os quais C. Menger - em que os métodos usados nos dois campos são fundamentalmente o mesmo (embora deva divergir desses autores quanto àquilo que deva ser considerado método). Os métodos consistem sempre em oferecer explicações causais dedutivas e em submetê-las a testes (por meio de previsões)". POPPER, KARL R. A miséria do historicismo. São Paulo, Cultrix/Edusp, 1980, p. 102.

2. Idem, ibidem.

3. Idem, ibidem, p. 104.

4. Idem, Conjecturas e refutações: O desenvolvimento do conhecimento científico. Brasília,Unb, 1983, p. 56.

5. Idem, A miséria do historicismo. São Paulo, Cultrix/Edusp, 1980, p. 1 1 0.

6. Carl G. Hempel apresenta uma análise bastante interessante dos fatores teóricos e práticos que influem na investigação científica. Ele diz: "Entre os muitos fatores que estimularam e sustentaram a investigação científica ao longo de sua longa história, figuram duas preocupações permanentes, que se constituíram nos motivos mais importantes para que o homem se desse a esforços no campo da ciência. Um deles é de caráter prático: o Homem procura, constantemente, melhorar a posição estratégica em que se situa diante do mundo onde vive e, para tanto, busca encontrar meios eficazes de prever o curso dos acontecimentos que têm lugar a sua volta e, sempre que possível, tenta controlá-los para disso tirar proveito. Quão bem sucedida houver sido a pesquisa na perseguição desse objetivo é evidenciado pelo campo vasto e continuamente crescente das aplicações tecnológicas, tanto construtivas como destrutivas, que imprimiram seu selo característico em todos os aspectos da civilização contemporânea". E, ao dar destaque aos fatores teóricos, continua: "A segunda motivação básica para a investigação científica em que o homem se empenha não envolve preocupações de ordem prática: reside, simplesmente, em sua curiosidade intelectual, em seu desejo profundo e persistente de chegar a conhecer e compreender o mundo que habita. Tão forte é essa necessidade de conhecimento e compreensão que, na ausência de informação fatual adequada, mitos são freqüentemente invocados para responder perguntas acerca do quê e do porquê dos fenômenos empíricos" (HEMPEL, CARL G. "Explicação científica", in SIDNEY MORGENBESSER (org.) Filosofia da ciência. São Paulo, Cultrix/Edusp, 1975, p. 159).

7. POPPER, KARL R. A miséria do historicismo. São Paulo, Cultrix/Edusp, 1980, p. 47.

8. Popper afirma: "Assim como o propósito da engenharia comum é o de projetar máquinas, aperfeiçoá-las e mantê-las, a tarefa da engenharia social de ação gradual é a de projetar instituições sociais, reconstruí-las e fazer as já existentes operarem. A expressão "instituição social" é aqui utilizada em sentido muito amplo, incluindo entidades de caráter público e privado. Valer-me-ei dessa expressão para aludir seja a uma pequena loja, seja a uma grande empresa de seguros, a uma escola, a um 'sistema educacional', à organização policial, a um tribunal ou a uma igreja. Um tecnologista ou engenheiro que acolha o método da ação gradual reconhecerá que apenas algumas instituições sociais brotam por força de um planejamento consciente, enquanto a grande maioria delas tão somente surge como conseqüência imprevista de ações humanas" (POPPER, KARL R. A miséria do historicismo. São Paulo, Itatiaia/Edusp, 1980, p. 52).

9. Idem, ibidem, p. 53.

10. Idem, ibidem., p. 53.

11. Idem, ibidem, pp. 53-54

12. Idem, ibidem, pp. 66 ss.

13. Idem, ibidem, p. 68.

14. Idem, ibidem, p. 69.

15. Idem, ibidem, pp. 70 ss.

16. DURKHEIM, ÉMILE. As regras do método sociológico. São Paulo, Nacional, 1977, p. 26.

17. Idem, ibidem, p. 25.

18. Idem, ibidem, p. 11.

19. NAGEL, ERNEST. La estructura de la ciencia. Buenos Aires, Paidás, 1968, p. 481.

20. POPPER, KARL R. A miséria do historicismo. São Paulo, Cultrix/Edusp, 1980, pp. 72-73.

21. Idem, ibidem, p. 2.

22. Idem, ibidem, pp. 77-78.

23. Idem, ibidem, P. 80-81.

24. Idem, ibidem, p. 83.

25. Idem, ibidem, p. 85.

26. NAGEL, ERNEST. op. cit., p. 543.

27. POPPER, KARL R. A miséria do historicismo. São Paulo, Cultrix/EdusP, 1980, PP. 89-90-

28. Idem, ibidem, pp. 95-96.

29. Idem, A lógica da pesquisa científica. São Paulo, Cultrix/Edusp, 1975, pp. 62-63.

30. HEMPEL, CARL G. op. cit., pp. 160-161.

31. POPPER, KARL R. A miséria do historicismo. São Paulo, Cultrix/Edusp, 1980, p. 98.

32. Idem, ibidem, p.101.

33. Idem, A lógica das ciências sociais. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1978, p. 16.

34. Idem, A sociedade aberta e seus inimigos. Vol. 11. São Paulo, Itatiaia/Edusp, 1974, p. 99.

35. Idem, ibidem, p. 101.

36. Idem, A lógica das ciências sociais. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1978, p. 32.